se reunen aqui textos que tratan de manera general la obra. Los textos y materiales sobre trabajos especificos se encuentra en la seccion portafolio

textos

Corpos fronteiriços, campo aberto

“Criamos espaços para os conteúdos que desejamos trabalhar e para as interrogações que temos1”, foi o que afirmou a criadora uruguaia Tamara Cubas à pesquisadora brasileira Jussara Xavier em uma entrevista realizada em 27 de novembro de 2004, com relação ao trabalho desenvolvido pelo coletivo do qual faz parte, o Perro Rabioso. Criado em 2002, na cidade de Montevidéu, esse agrupamento de artistas vem se dedicando ao longo dos últimos 15 anos ao desenvolvimento de projetos artísticos e culturais que aproximam a música, o vídeo, a dança e a performance. Coerente com o que apontou, nos trabalhos do grupo é possível identificar distintos eixos de pesquisa e de linguagens. 

Tamara Cubas (Montevideu,1972), uruguaia, tem uma história familiar que como outras da sua geração está marcada pelo que sofreu durante a ditadura uruguaia (1973-1985); Tendo partido com a sua família para o exílio em Cuba de onde só regressou em 1985. Menos falada que outras ditaduras latino-americanas, a uruguaia não foi por isso menos criminosa com um regime que usou a tortura, a prisão e fez desaparecer muitos opositores, entre os quais guerrilheiros tupamaros. A memória destes anos faz parte da biografia da coreógrafa e ela é assumida em muitos dos seus trabalhos, tendo inclusivamente dado origem a uma investigação no seio da própria família. 

In contemporary dance, the interest in discussing the history and present of colonialism and nationalism has increased in the last decade. This has led to new aesthetic and political approaches, and also to dialogues, cooperation and disagreements with other dance traditions such as folk dances. Often dialogues have turned into disputes concerning the legitimacy of dancing issues related to national or local identities. In Uruguay, where the national history has been culturally and racially whitewashed – racial diversity being underrepresented in the collective imaginaries about the Uruguayan population – the entrance of these topics on the public arena of debates is an important moment which represents significant transformations in political subjectivities and their ways of expression; both inside and outside the artistic field.

Realizaré un recorrido crítico por las últimas 5 creaciones escénicas de Tamara Cubas. Me propongo ver qué hace en sus coreografías, qué formula en ellas: la política y la ética que sus obras movilizan, o mejor: lo que estas creaciones hacen. Mi intención es observar a través de ellas – como quien mira por una rendija – algunas decisiones, metodologías y motivaciones que dan lugar a las mismas y que caracterizan su proceso de investigación. Examinaré también los procedimientos (o “experimentos”) mediante los cuales desarrolla sus investigaciones artísticas: el modo -por ejemplo- en que la artista emplea al archivo como una práctica y como una herramienta.

En la relación con tres términos que se juega entre una imagen, su objeto (que construye la vista) y su sujeto (que construye la visión de todo), uno encuentra siempre esta necesidad estructural de la posición.

Margarita sanchez / 2020

Lo colectivo

Procedente de una familia de militantes de izquierda que fueron perseguidos durante la dictadura militar (su tía fue presa, su tío desaparecido y su padre tuvo que exiliarse en Cuba), el hallazgo de una foto que sobrevivió al encarcelamiento de su tía, vivir de niña el desmembramiento de su familia y de su sociedad producido por las desapariciones y por el número de personas que se exiliaron por esta causa, le motivó a indagar en el pasado familiar, compartir anécdotas y su quehacer artístico con sus parientes, así como interesarse en la dicotomía entre lo personal y lo colectivo, y en los resortes que mueven a la colectividad.

ATOS DE UMA OPERAÇÃO ANTROPÓFAGagica

Corpos fronteiriços, campo aberto

 “Criamos espaços para os conteúdos que desejamos trabalhar e para as interrogações que temos1”, foi o que afirmou a criadora uruguaia Tamara Cubas à pesquisadora brasileira Jussara Xavier em uma entrevista realizada em 27 de novembro de 2004, com relação ao trabalho desenvolvido pelo coletivo do qual faz parte, o Perro Rabioso. 

Criado em 2002, na cidade de Montevidéu, esse agrupamento de artistas vem se dedicando ao longo dos últimos 15 anos ao desenvolvimento de projetos artísticos e culturais que aproximam a música, o vídeo, a dança e a performance. 

Coerente com o que apontou, nos trabalhos do grupo é possível identificar distintos eixos de pesquisa e de linguagens. Em Actos de Amor Perdido (2010) são os procedimentos ligados às práticas da dança contemporânea que dão forma a uma obra que compartilha em 12 atos alguns episódios da violenta ditadura civil-militar uruguaia (1973-1985). Já em El día más hermoso (2012) 12 obras vinculadas às artes visuais, como fotografias, documentos, desenhos, instalações e vídeos, compõem uma exposição por meio dos materiais advindos das correspondências mantidas durante o período de exílio, prisão e desaparecimento de parte dos familiares paternos de Tamara. 

Ambos os experimentos são eixos paralelos de uma mesma investigação, La Patria Personal que, através de arquivos oficiais e pessoais, revisou a história recente de um país que até o ano de 2011 manteve as leis da anistia e a da caducidade, que impediam os processos de investigação e punição dos inúmeros casos de violações dos direitos humanos cometidos pelos militares durante o período ditatorial. Através de propostas como essas, bem como de outras que compõem a trajetória do Perro Rabioso, é notório constatar o engajamento de seus artistas em manter uma perspectiva ética e cidadã como principal motor crítico e poético de suas criações. 

Acerca dos procedimentos de pesquisa elaborados pelo coletivo, vale destacar seu comprometimento não somente com a criação, mas também com processos de formação e de gestão coerentes com suas indagações. É através desse viés que, a partir de 2016, Tamara Cubas passa a dirigir o Campo Abierto, localizado na cidade de Rivera, na fronteira entre o Uruguai e o Brasil, e que tem como principal foco promover encontros que aproximem as searas artísticas e sociais. “A ideia sempre é de se relacionar, provocar, se perguntar, questionar, pensar, essa é uma das capacidades ou potências que tem a arte2”, afirma a criadora em uma reportagem de 24 de outubro de 2017, intitulada “A arte se inserindo na trama social e cultural fronteiriça”, feita pelo jornal uruguaio La Jornada por ocasião do Tercer Paisaje – Festival Internacional de Arte en Relación. 

De algum modo, a afirmação feita em 2004 tem relação com a ideia expressa 13 anos depois, quando a artista idealiza o Campo Abierto, projeto que almeja, literalmente, criar espaços para práticas que, muitas vezes, não tem seu lugar assegurado no estágio atual do capitalismo financeirizado. Em uma área de 10 hectares, longe dos grandes centros urbanos, e na contramão do ideal neoliberal de produtividade, a equipe envolvida nessa iniciativa vem promovendo distintas ações dedicadas a outras formas de “economia do tempo”, a partir das quais possam emergir partilhas de experiências em diversas áreas como a educação, a cultura, a arte e a tecnologia. Por intermédio do apoio de instituições públicas e privadas do Uruguai, sua programação já recebeu diversos artistas nacionais e internacionais para residências, laboratórios coletivos, entre outras proposições que permitiram o fortalecimento de uma rede na qual o local e o global estão em constante diálogo. 

Esse exemplo encontra paralelos em experiências realizadas por criadores como o coreógrafo brasileiro Marcelo Evelin, com o qual Tamara Cubas já trabalhou, e que a partir de 2015, passa a coordenar o Campo, espaço localizado na cidade de Teresina articulado para dedicar-se à realização de encontros e residências nos quais os temas mobilizadores estão ligados à gestão e à criação em arte contemporânea. Tal proposta possui forte conexão com os 10 anos de existência do Núcleo do Dirceu (2006-2016), 2 Tamara Cubas, “El arte insertándose en la trama social y cultural fronteriza”, Rivera: La Jornada, 24 de outubro de 2017. Tradução minha para: “La idea siempre es la de relacionarse, provocar, preguntarse, cuestionar, pensar, esa es una de las capacidades o potencias que tiene el arte”. 2 onde, conjuntamente com Evelin, diversos colaboradores mantiveram uma plataforma empenhada no fortalecimento de criações vinculadas às artes do corpo realizadas para além das principais capitais brasileiras. Será a partir desses contextos e desses pressupostos que Tamara Cubas, artistas do Perro Rabioso e alguns convidados criam a Trilogia Antropofágica (2016, 2017). 

Só a antropofagia nos une socialmente, economicamente, filosoficamente Se na introdução de Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia, os pensadores franceses Gilles Deleuze e Félix Guattari afirmam que “os princípios em filosofia são gritos, em torno dos quais os conceitos desenvolvem verdadeiros cantos3” se poderia cogitar que essa seria a mesma operação realizada por Tamara Cubas ao dirigir os três atos da trilogia que elegeu a antropofagia como conceito central. Há um canto potente que pede passagem através da operação antropófaga que é corporificada e ressoada de modo singular em cada face desse tríptico, e que, assim como os processos de criação de tais obras, propõem uma outra economia do tempo aos que compartilham esses experimentos. 

 Em linhas gerais, o que tal trilogia investe como procedimento central é a apropriação de princípios utilizados por criadores brasileiros em obras que explicitam que a dança, como prática política, pode abrir caminhos que colocam os corpos, dos que fazem e assistem, na contramão das ideologias produtivas dominantes. Ao operar através da antropofagia, mais do que mimetizar alguns códigos, os criadores do Perro Rabioso se predispuseram a radicalizar as ações contra-hegemônicas que cada obra brasileira que serviu de inspiração almejava precipitar: os atos de permanecer, resistir e ocupar. 

O Manifesto Antropófago (1928), elaborado pelo escritor brasileiro Oswald de Andrade, serviu como estímulo a partir do qual foi possível realizar um corte epistemológico “contra todos os importadores de consciência enlatada4” que provocou na poética de Tamara Cubas uma expansão nos modos de evocar os corpos presentes e ausentes nas histórias narradas como oficiais da América Latina. 

Não são poucos os exemplos que evidenciam como a antropofagia ecoou em inúmeras teorias e práticas emergidas do território latino-americano. A crítica de dança uruguaia Lucía Naser, por exemplo, enfatiza que nos escritos de Oswald “essa metáfora indica como o primitivo, o homem ameríndio, o canibal-civilizado e atual brasileiro, devora a cultura alheia e se apropria dela, transformando-a e fazendo-a sua sem culpa5”. Se os impulsos da arte moderna desejavam chamar a atenção para a constituição de uma identidade nacional, que deveria estar conectada às particularidades de sua formação, é porque ainda predominavam influências que se sobrepunham a tal desejo. Diversos foram os artistas que procuraram deflagrar as contradições macroeconômicas de países que, embora já tivessem realizado seus processos de independência, continuavam dependentes, também culturalmente, das grandes potências mundiais. Outros, porém, dedicaram-se à investigação de como tal dado histórico incidia na subjetividade dos sujeitos desses contextos. 

 Será por intermédio de investigações advindas dessa segunda linhagem que o Perro Rabioso encontrará relevantes referenciais para a criação de sua trilogia. Um exemplo significativo será o repertório da artista plástica brasileira Lygia Clark, que nos anos 1970 retomou alguns dos elementos do manifesto para criar a proposição da Baba Antropofágica (1973), que, assim como seus objetos relacionais, buscava aproximar os territórios da arte e da clínica. Nespesquisa a ação, um corpo despido recebe os fluidos vindos de finas linhas que saem de carretéis de máquinas de costura guardadas dentro das bocas dos participantes, o que acaba por mobilizar uma sutil conexão entre os que depositam os fios e o corpo que os recebe. A antropofagia aparece aqui como possibilidade de estar à disposição das materialidades e subjetividades de outrem. 

Uma das referências seminais para a análise do importante legado de Clark é o trabalho realizado pela psicanalista brasileira Suely Rolnik, que dedicou grande parte de seus estudos à artista, e que irá recorrer à noção de antropofagia em diferentes momentos de suas proposições. Em textos como Subjetividade Antropofágica, que faz parte de uma das publicações produzidas na ocasião da 24a Bienal de São Paulo (1998), afirma que as práticas de canibalismo podem nos incitar a um “deixar-se afetar por estes outros desejados a ponto de absorvê-los no corpo, para que partículas de sua virtude se 5 Lucia Naser, Comemos lo que somos, Montevidéu: La diária, 12 de dezembro de 2017. Tradução minha para: “Esa metáfora indica cómo lo primitivo, el hombre amerindio, el caníbal-civilizado y actual brasileño, devora la cultura ajena y se apropia de ella, transformándola y haciéndola suya sin culpa”. 4 integrassem à química da alma e promovessem seu refinamento6”. O exemplo escolhido se inspira no banquete realizado pelos Caetés em 1556 ao se alimentarem dos corpos da tripulação que naufragou na costa brasileira, na qual estava o primeiro bispo do Brasil, o português Pero Fernandes Sardinha, tida como a primeira experiência antropófaga. 

Se para Oswald de Andrade só a antropofagia poderia nos unir socialmente, economicamente e filosoficamente, para Tamara Cubas foram as metodologias experimentadas em laboratórios abertos desde 2015, inspirados em atos antropófagos, que permitiram ao longo da elaboração de sua trilogia a ampliação da “capacidade de ser modificado por um Outro através dos conceitos antropofágicos7”. Ao se alimentar da obra Vestígios (2010), da dançarina brasileira Marta Soares e formalizar o Acto I – Permanecer (2016); ao deglutir Matadouro (2010), do diretor brasileiro Marcelo Evelin, para criar o Acto II – Resistir (2016); e ao devorar a criação Pororoca (2009), da coreógrafa brasileira Lia Rodrigues e dar vida ao Acto III – Ocupar (2017), a trilogia produziu exatamente o que Suely Rolnik observou em Antropofagia Zumbi (2008), quando destaca que “o efeito desta presença viva não pode ser representado ou descrito, mas apenas expresso, em um processo que requer invenção, a qual se concretiza performaticamente: numa obra de arte, mas também num jeito de ser, sentir ou pensar, numa forma de sociabilidade, num território de existência8”. 

 Permanecer, um ato primeiro 

 Em Vestígios, primeira obra “antropofagizada”, o público é recebido em uma sala na qual há uma estrutura circular onde está acumulada uma quantidade significativa de areia fina. Quem assiste pode se deslocar e escolher onde se posicionar em torno desse aparato que tem um ventilador direcionado para a pequena montanha formada, fazendo com que, pouco a pouco, os grãos comecem a ceder à gravidade. Nessa mesma ambiência são projetadas imagens que se assemelham ao que se vê ao vivo. O vídeo é o registro  imagético e sonoro de paisagens que fazem parte de um cemitério pré-histórico localizado na cidade de Laguna, no estado brasileiro de Santa Catarina. São sambaquis – tãba (conchas) e ki (amontoado) – que guardam vestígios das formas de vida e morte da cultura tupi, cujo processo de fossilização pode deixar como rastro pontas de flechas, colares e urnas funerárias. 

É nessa mesma localidade que Marta Soares realizou imersões físicas a fim de investigar as marcas de existências anteriores ao início do processo de colonização do Brasil. A forma sutil como Soares sintetiza tal experiência in loco em sua obra se opõe à perversa devastação que foi capaz de transformar os resquícios em cal e material para a construção de diversos edifícios do período colonial, principalmente de engenhos de açúcar. 

Durante os sessenta minutos de duração da obra, pela força do vento produzido, se revelam, primeiro fios de cabelo, mais adiante pés, e por fim partes que formam um corpo. Ao longo dessa uma hora a bailarina permanece imóvel, e quem performa é o tempo. É ele que permitirá que o público acompanhe o processo desse corpo sendo revelado, e, nessa espécie de exumação, muitas vezes não é fácil diferenciar o que é corpo do que é a areia, já que ambos possuem um tom muito próximo. O que temos são apenas indícios de uma presença que não se revela por completo. 

Ao final do espetáculo nem toda areia foi removida, e nem todo o corpo foi revelado. O rosto não se torna conhecido, e é a ausência de reconhecimento desse outro sujeito que pode remontar ao que o filósofo franco-lituano Emmanuel Levinas abordou em seus escritos acerca de uma ética que se afirmaria a partir da presença de outrem, onde “o modo como o Outro se apresenta, ultrapassando a ideia do Outro em mim, chamamo- lo, de fato, rosto9”. Pela perspectiva de Levinas, mais que a face, o rosto seria um índice de abertura à alteridade, e uma vez que o rosto submerso não aparece em nenhum momento da obra, a ausência dos outros que também poderiam ser reconhecidos e nomeados através dos materiais dos sambaquis, se faz presente. Ao eleger não se mover, a criadora reafirma a necessidade de demarcar territórios geográficos e simbólicos para se permanecer, e para que frente a eles possamos enxergar as muitas camadas dos contínuos sepultamentos aos quais fomos e ainda estamos sujeitos em contextos como o da América Latina. 9 Emmanuel Levinas, Totalidade e Infinito, Lisboa: Edições 70, 1980, p. 287. 6 São essas materialidades que alimentam a obra Acto I – Permanecer (2016), que estreou em Montevidéu, e que também se apresentou em Salvador (2016) e em Lisboa (2017). 

Interessado em borrar as fronteiras entre os conceitos de autoria, apropriação e contaminação, assim como dinamitar as fronteiras que separam criadores e observadores, o Perro Rabioso recepciona os que participarão dessa obra duracional de cinco horas com instruções bastante precisas: Convidamos todos a permanecerem de pé numa plataforma coberta de carvão e em constante movimento. O tempo de exposição de cada um será determinado pela chegada de outra pessoa. Não há possibilidade de pacto, nem de acordo. Cada um decide quando subir, sabendo que permanecerá até o momento em que alguém ocupe o seu lugar. Um a um iremos permanecendo, descalços, em silêncio e olhando uns para os outros. A justaposição de nossas singularidades fará a identidade do nosso coletivo10. Figura 01: Ato I – Permanecer, Perro Rabioso Fonte: Arquivo do Perro Rabioso 10 Tamara Cubas. Trilogia Antropofágica, Lisboa: Teatro Municipal São Luiz, setembro de 2017. 7 

A performer brasileira Eleonora Fabião, no texto Programa performativo: o corpo-em-experiência (2013), inspirada em Deleuze e Guattari, destaca a necessidade da elaboração de enunciados para a construção de atos performativos que funcionem como “um conjunto de ações previamente estipuladas, claramente articuladas e conceitualmente polidas a ser realizado pelo artista, pelo público ou por ambos sem ensaio prévio11”. E é exatamente essa escolha priorizada pelos criadores que convoca e possibilita que todos os que participam de Acto I possam agir. 

 No decorrer de trezentos minutos o silêncio tenderá a predominar no ambiente. Algumas vezes os sons dos que chegam geram ruídos que alteram brevemente a cumplicidade dos que permanecem e, em outras, a sonoridade que marca a impermanência do ato de tentar se manter neste solo que não cessa de vibrar é a do motor da estrutura que funciona como imprevisível marcador temporal da obra. Não se sabe que parte da plataforma se deslocará, e nem o intervalo em que isso acontecerá, assim como é inesperado como cada corpo reagirá para sustentar a imprevisibilidade de tal experiência. Uns precisam aplicar mais força contra a base, outros buscarão abrir as pernas para ganhar equilíbrio, mas tudo isso a partir de escolhas rápidas feitas ao se entrar na plataforma, já que, depois de se posicionar, não é mais permitido se mover. Quem está fora acompanha os diferentes sujeitos, em sua maioria alheios às práticas artísticas, buscando conjugar o verbo permanecer, ao mesmo tempo em que são cúmplices dessas tentativas. 

A necessidade de olhar para os outros que ali estão faz com que os rostos funcionem como imãs da alteridade que conectam os que estão dentro aos que estão na plateia. Mesmo que o coletivo que se forme não seja sempre o mesmo, é possível constatar uma singularidade constituída que une todos os que estão presentes. Há um foco comum de atenção que faz com que todos que performam na parte externa da estrutura observem juntos os movimentos tectônicos do hipnotizante chão de carvão, e, principalmente, as peculiaridades de cada pessoa que ali sobe. 

A partir das instruções iniciais que o público recebe ao entrar na obra o que se deflagra é a total impermanência a que todos estão submetidos durante as cinco horas de duração da performance. Tal experiência produz “composições atípicas de velocidades e operações afetivas extra-ordinárias que enfatizam a politicidade corpórea do mundo e das 11 Eleonora Fabião, “Programa performativo: o corpo-em-experiência”, Campinas: Revista ILNX, n. 04, 2013, p. 04. 8 relações12”. As regras do programa performativo de Acto I – Permanecer enfatizam que, através de cada rosto que ali se expõe, se materializa a construção de uma zona de alteridade que demanda tempo e comprometimento de um coletivo. Por intermédio de práticas ligadas à performance como as realizadas por Marta Soares e Tamara Cubas, que apostam na tensão de outras temporalidades, pode-se reconhecer a possibilidade de vivenciar em grupo o tempo-em-experiência, e é nesse sentido que o segundo ato da trilogia dará continuidade à pesquisa. 

Resistir, um segundo ato 

A segunda obra eleita para ser devorada foi Matadouro (2010), de Marcelo Evelin, inspirada em Os Sertões, do escritor brasileiro Euclides da Cunha. O livro narra o contexto da Guerra de Canudos (1896-1897), ocorrida no interior do estado brasileiro da Bahia, a qual Evelin já havia usado como referência para a criação de obras como Sertão (2003) e para Bull Dancing (2006). Conjuntamente com os criadores do Demolition Incorporada e com o Núcleo do Dirceu o coreógrafo elege a última parte de Os Sertões, “A Luta”, para realizar um espetáculo inspirado na resistência daqueles que, mesmo sem possuírem os mesmos armamentos de guerra, enfrentaram, ao longo de quatro expedições militares, aproximadamente, doze mil soldados do exército brasileiro. 

Os massacres ocorridos no sertão da Bahia, que acabaram por dizimar a cidade de Canudos e matar mais de vinte e cinco mil pessoas, aconteceram no contexto da violenta transição ocorrida após a proclamação da independência em 1822, quando o Brasil foi convertido em uma monarquia constitucional, durante o período do Império (1822-1989). A rebelião popular foi gestada em uma região do país que passava por uma grave crise econômica e social, gerada por cíclicos períodos de seca e que, por consequência, deixou inúmeros latifúndios improdutivos. Sertanejos e antigos escravos de diversas cidades se concentraram em Canudos através da liderança religiosa de Antônio Conselheiro e, unidos pelo mesmo ideal, acreditavam que através da fé e da luta seria possível conquistar a autonomia daquela região, que já não desejava mais ter vínculos com a Igreja e o Estado. 

Devido à desigualdade entre os que se rebelaram e os que defendiam o regime republicano, a insurreição de Canudos também pode ser compreendida como uma batalha, e o que Evelin resgatará não será a representação literal de tal acontecimento 12 Idem, p. 05-06. 9 histórico, mas a força daqueles que precisaram manter seus corpos em estado de luta. Essa escolha não foi aleatória, se deu, sobretudo, pela implicação do criador em um território próximo e análogo ao de Canudos, com condições áridas de sobrevivência, alheio aos grandes centros urbanos e econômicos do Brasil, e pela compreensão de que, mesmo já sendo outro o momento histórico, tal luta ainda continua urgente. 

A obra se inicia com a entrada de um homem que segura um tambor. Ele está nu, usa apenas a máscara de um felino, caminha em círculo e toca com força o instrumento. No palco iluminado, que tem apenas um microfone no centro, um breve black-out é gerado, e logo na sequência passa-se a ouvir latidos de cachorros. As batidas do tambor continuam e se tornam cada vez mais frenéticas, chegando a soar como tiros. Ao se posicionarem ao fundo do palco e de frente para a plateia outros corpos se somam à cena, formando uma linha cujos sujeitos dão as costas aos espectadores. Eles também ficam nus, sendo reconhecível que, grudadas à pele de cada um, existem grossas fitas adesivas de coloração marrom que seguram grandes pedaços de madeiras, remetendo a facas. 

 O “Quinteto em Dó maior”, última obra criada pelo músico austríaco Franz Schubert, começa a tocar e outra atmosfera se instaura, oposta aos sons do tambor e dos latidos. Compondo tal polifonia se somam barulhos produzidos por bastões de metal que são raspados pelos que estão de costas. Após um ápice, esse movimento é pausado. Apenas a música do quinteto retorna e os performers colocam variadas máscaras e perucas. Ao se virarem é possível reconhecer que os seres mascarados poderiam ter saído de alguma manifestação da cultura popular latino-americana, ou até mesmo de uma loja de fantasias de qualquer rede multinacional. Esses seres caminham em círculos, todos no mesmo sentido, e através de aceleramentos e variações da sonoplastia passam a correr. 

 Há uma coreografia nessa corrida que faz com que os integrantes permaneçam equidistantes uns dos outros, e que, de tempos em tempos, pequenas diferenças alterem o estado desse constante movimento circular. Em um instante é a mão direita de um deles que se levanta, em outro, um dos dançarinos começa a se movimentar com uma coluna que se assemelha a de um chimpanzé. São alterações breves e sutis que interferem no ritmo do coletivo. Em alguns trechos da música os corpos flutuam com seus braços, se lançam em estrelas e mortais, tentam driblar algo, chegando a parecer que estão sambando. Se juntam em um coro para uma rápida corrida, formando um aglomerado semelhante às folias carnavalescas, momento no qual se tocam, se abraçam e brincam. 

Mas isso é apenas um átimo de uma obra que dura uma hora, e na qual, em sua maioria, os criadores mantêm o foco na ação única de andar em círculos para a esquerda, 10 correndo no sentido oposto ao do relógio, provavelmente, contrariando alguma norma. Em 2013, em entrevista realizada pelo crítico de arte francês Stéphane Bouquet para a 42a edição do Festival D ́Automne à Paris, Marcelo Evelin afirma que em tal obra a resistência aparece “sem esperança, literalmente, porque o mundo é um sistema, um sistema econômico, um sistema de identidades, um sistema rígido ao qual não se pode escapar13”. Porém insiste que as pequenas quebras que acontecem na peça poderiam funcionar como “um instante de libertação dessa força que nos abate, um pequeno momento de poesia14”. 

Ao final, o que resta são corpos cansados e suados, mas ainda em movimento, e é para o microfone, que se manteve no centro do palco todo esse tempo, que todos se dirigirão para encerrar a obra. Já desmascarados, olham concentradamente para a plateia enquanto respiram ofegantemente. Mas nenhum som sairá de bocas que optam pelo silêncio e de corpos que preferem retirar-se. O matadouro, expressão usada pelos portugueses para os abatedouros, estava lá desde o começo. A batalha já reconhecia a ausência de saídas, mas mesmo assim manteve, enquanto foi praticável, sua resistência. 

É a partir desse estado que os criadores do Perro Rabioso se contaminam para criar Acto II – Resistir (2016), que estreou em Montevidéu e se apresentou também em Salvador (2016) e Lisboa (2017). Logo no começo da obra um cachorro da raça cimarrón, que chega domesticada no Uruguai, mas que consegue escapar e tornar-se selvagem durante o processo de independência do país, percorre uma quantidade significativa de tábuas de madeira soltas e procura o que pode estar por baixo desses escombros. Paralelamente, no fundo do palco, os criadores adentram esse território instável e começam a pular sobre centenas de pedaços de madeira que reverberam os movimentos dos cinco corpos que o pressionam. O cão segue sua busca, enquanto o coro dos humanos não para de se mexer com um pulso que será vigoroso durante os cinquenta minutos de realização do espetáculo. 

O animal sai de cena e os corpos aglutinados se aproximarão cada vez mais, a ponto de poderem se apoiar uns nos outros e, juntos, terem a habilidade de se abaixarem, se levantarem ou o que desejarem. O ânimo com que eles mantêm essa coletividade dá a impressão de que eles poderiam estar comemorando apaixonadamente a vitória de algum 13 Marcelo Evelin, Matadouro, Paris: Festival D ́Automne à Paris, p. 06. Entrevista concedida a Stéphane Bouquet. 14 Idem. 11 time de futebol, vibrando freneticamente em algum evento musical ou até mesmo lutando por uma causa urgente, isso não importa: o que se nota é que existe algum elo comum que conecta a todos. Há também algum traço de fúria, pois os corpos não saem de tal estado, fazendo lembrar o episódio ocorrido em 1518 na cidade de Estrasburgo na França, quando um fenômeno social teria feito quatrocentas pessoas dançarem durante aproximadamente quatro meses, período no qual chegou a falecer quinze pessoas por dia devido à exaustão. 

O historiador americano John Waller investigou arquivos desse singular episódio que dão indícios de que fenômenos dessa natureza tendem a acontecer após desastres de grandes magnitudes. Nesse caso específico, o pesquisador diagnostica que os impactos gerados pelas epidemias de varíola, lepra e sífilis teriam influenciado a produção de uma histeria em massa, na qual a dança pediu passagem nos corpos de grande parte da população. Mesmo não tendo o porte de uma epidemia são diversos os exemplos de eventos ou festividades de longa duração que comprovam que a energia produzida por 12 um coletivo pode fazê-lo manter-se por dias a fio em ações que ultrapassam limites e levam à exaustão e ao êxtase, como nas práticas do desejo que inventam novas configurações corporais para fazerem emergir outros prazeres possíveis. 

 Avançando para a parte frontal do palco, os performers gozam dos saltos e das reverberações que produzem e se desfazem da lógica, na mesma medida em que retiram as peças de roupa que vestem. Despidos de certa parte de humanidade, os corpos estão visivelmente mais próximos à liberdade vivenciada pelos animais. Há uma atmosfera de selvageria que é interrompida por um black-out. Não enxergamos mais os dançarinos, já transmutados em uma matilha, o que escutamos agora são latidos e o que vemos são cinco cachorros que atravessam o palco no sentido contrário ao realizado pelo coro dos humanos. É interessante associar essa mutação à presença de outras existências em nós, que não somente a humana, como observa Lygia Clark em carta escrita em 1967, endereçada ao crítico de arte brasileiro Mário Pedrosa, na qual compartilha as seguintes questões: 

Quantos seres sou eu para buscar sempre do outro ser que me habita as realidades das contradições? Quantas alegrias e dores meu corpo se abrindo como uma gigantesca couve-flor ofereceu ao outro ser que está secreto dentro de meu eu? Dentro de minha barriga mora um pássaro, dentro do meu peito, um leão. Este passeia pra lá e pra cá incessantemente. A ave grasna, esperneia e é sacrificada. O ovo continua a envolvê-la, como mortalha, mas já é o começo do outro pássaro que nasce imediatamente após a morte. Nem chega a haver intervalo. É o festim da vida e da morte entrelaçadas15. 

Para trabalhar a noção de corpo-bicho, Suely Rolnik retoma tais palavras no texto Lygia Clark e o híbrido arte/clínica (2015), e indica que tal estado pode estar potencialmente presente em práticas que funcionam como “uma reserva ecológica das espécies invisíveis que povoam nosso corpo-bicho em sua generosa vida germinativa; manancial de coragem de enfrentamento do trágico”16, dando vazão para ponderar que, ao reafirmarem uma resistência à civilidade e uma abertura ao selvagem, os artistas do Perro Rabioso permitiram salientar a presença de uma força transformadora de lógica não racional. É nesse mesmo sentido que a crítica escrita por Lucía Naser sobre o Acto II – Resistir, sublinha que para a existência dessa força é necessário “amar a vida e entregar 15 Lygia Clark, “Carta a Mário Pedrosa”, in: Sônia Lins, Artes. Gent: Snoeck Ducaju & Zoon, 1996. 16 Suely Rolnik, “Lygia Clark e o híbrido arte/clínica”, Rio de Janeiro: Revista Concinnitas, n. 26, 2015. 13 o eu para a alquimia de uma potência muito maior: a coletiva17”, vetor fundamental dessa obra e, primordialmente, para a obra que encerrará tal trilogia. 

Ocupar, por fim 

 A última obra que alimenta e finaliza a Trilogia Antropofágica é Pororoca (2009), de Lia Rodrigues. O trabalho foi criado através do encontro da coreógrafa com a Redes de Desenvolvimento da Maré, organização da sociedade civil de interesse público que atua desde 1997 no complexo das favelas que formam o bairro da Maré, localizado na zona norte da cidade do Rio de Janeiro. O motor do espetáculo é a palavra poro’rog (estrondar), oriunda do tupi, que dá nome ao confronto das correntes fluviais e das águas oceânicas, que ocorre principalmente na foz do rio Amazonas. Apesar de ser fundamental para a fertilização dessas terras, esse fenômeno natural costuma gerar processos bastante violentos, uma vez que destroem margens e reestruturam a geografia do local. 

Tal imagem é eleita pelos criadores para ser a síntese de uma possível maneira de estar aberto aos encontros da Maré e do mundo em uma obra que começa com uma espécie de turbilhão que arrasta tudo o que o coro traz consigo, como mesas, cadeiras, roupas, sacos plásticos, caixas de papelão, além das vozes que formam essa forte onda. Essas materialidades sobram nas bordas do palco para, então, como em um cardume, os corpos encontrarem uma pulsação comum. Nessa coralidade há espaço para que cada um haja de forma singular, porém, sempre em relação ao grupo, que acolhe e impulsiona os deslizamentos sincronizados dos 11 artistas em movimento. São muitas as gestualidades executadas de forma ágil, que vão desde passos característicos da dança moderna até elementos do contemporâneo, de partituras lineares ao quadril desenfreado do funk, de afagos demorados a puxões de cabelo, de saltos dispersos a corpos no plano baixo. 

Há uma lógica que mantém cada indivíduo sempre em relação a outro, formando pares que tem a liberdade para se reconfigurarem continuamente. Não se mantém o estrondo do começo, e, mesmo que uma mão tente tampar uma boca, as sonoridades desses corpos continuam a fazer parte desse processo. Breves momentos de pausa interrompem esse fluxo, quando, por exemplo, dois homens sentados podem se olhar com 17 Lucía Naser, Acto II – Resistir en el Cerro de Tamara Cubas, Montevidéu: Juntando Notas, 31 de agosto de 2016. Tradução minha para: “Amar la vida y entregar el yo para la alquimia de una potencia mucho más poderosa: la colectiva”. 14 calma e se abraçar enquanto a maioria parece estar desfalecida; ou quando uma roda é armada, no centro da qual, como um animal irritado, um dos criadores reage às provocações feitas pelos que o rodeiam, onde os bípedes do lado externo se convertem no quadrúpede que toma a posição central; ou, já em outra cena, os criadores formam uma manada onde não se reconhece se são homens que engatinham levando animais nas costas ou se são animais levando homens, uma vez que ladram, miam, uivam e emitem sons de animais diversos. 

 Eliana Sousa Silva, diretora e fundadora da Redes de Desenvolvimento da Maré, compartilha que “Pororoca não é sobre a favela, mas a favela está aí. Na favela também é assim. É tudo junto e misturado18”. Já Silvia Soter, dramaturgista do espetáculo, afirma que “em Pororoca, o estar junto tenta enfrentar as formas de convívio com o choque, o embate, a mistura, o ceder, o atacar, o agir e o permanecer19” e acrescenta que “se forma e conceito se atravessam em cena, seria possível reconhecer em Pororoca (…) um corpo coletivo construído como amálgama que, ao mesmo tempo, destacaria e borraria singularidades20”. 

É a partir dessa atenção às individualidades que Ato III – Ocupar (2017), que estreou em Lisboa e também se apresentou em Montevidéu (2017), se inicia. Com as cortinas abertas o público encontra no centro do palco um muro composto por tábuas que o dividem, as mesmas que formavam os escombros no segundo ato. Ao fundo há um monte estruturado por estreitos pedaços de madeira. Uma primeira pessoa cruza o palco e, de costas, escolhe os maiores pedaços de pau que estão nesse amontoado para, a partir de então, começar a quebrá-los no chão. Outras pessoas irrompem o espaço, cada qual realizando partituras singulares, que incluem as ações de lançar, agarrar, bradar, correr, entre outras. Em alguns trechos, como se houvesse enfrentamentos entre tribos rivais, nota-se que essas movimentações implicam na necessidade de ora se defender, ora atacar. 

O barulho das pauladas é contínuo, até o momento em que o performer que iniciou a obra passa a usar os pedaços para preencher as frestas do muro. Outros sons que tomam o espaço são os dos tênis agitados que deslizam no linóleo, além dos gritos liberados que 18 Silvia Soter, “No movimento da Piracema: reflexões sobre a prática de dramaturgista”, in: Cristina Espírito Santo; Christine Greiner; Sônia Sobral, Cartografia Rumos Itaú Cultural Dança 2012-2014, São Paulo: Itaú Cultural, 2014, p. 35. 19 Idem, p. 37. 20 Ibidem, p. 34. 15 se parecem com cantos primitivos. Essas sonoridades estão em consonância com as tentativas de abrir a boca do outro para, talvez, roubar sua língua, além dos esforços em vomitar e cuspir. É na sequência de reações análogas a essas que se instaura uma espécie de celebração coletiva na qual alguma alegria transborda. Alegria essa que poderia ser a de uma festa ou a de uma manifestação onde, mesmo que o coletivo esgote sua energia e precise pausar e silenciar, uma das criadoras tem a liberdade para manter seu ritmo, e sozinha, poder dar voltas nesse muro uma, duas, três, muitas vezes, como em um looping de alegres vibrações que não tem hora para acabar. Figura 03: Ato III – Ocupar, Perro Rabioso Fonte: Arquivo do Perro Rabioso 

A pulsação coletiva é retomada quando um corpo nu se posiciona diante do muro e através do quadril parece desejar penetrá-lo, momento no qual um coro se forma para chorar, lamentar, agonizar, até que, como em uma ruptura forte, todos voltem para as suas movimentações. Já não são mais os mesmos, voltam transformados, quiçá perturbados, mas livres, com outras peles, com roupas trocadas, com outras emissões vocais. Como em uma festa dos outros, dos loucos, das crianças e dos animais onde é permitido dar 16 vazão a sonoridades de toda natureza, ou como em um corajoso ato político organizado por um coletivo que se posiciona para lançar coquetéis molotov e, pronto para o que der e vier, coloca camisetas na cabeça para assim estar disponível, de fato, para o que tiver que acontecer. 

Tais gestos não são narrativos e deixam margem para que se imagine muita coisa. De forma estranhada usam calcinhas, sutiãs, cuecas, ou o que quer que seja, experimentando outras possibilidades, como se estivéssemos às vésperas de um por vir iniciado pelo esgotamento. Como se tivéssemos perdido a pretensa estabilidade dos acordos de civilidade e agora nos fosse autorizado escancarar outras dimensões da existência que não somente a humana. Ao final, em um breve instante, um dos criadores pula do palco e invade a plateia, anunciando que uma ocupação está para começar, ou talvez, já tenha se iniciado e ainda não nos demos conta, como em uma incontornável revolução que deixará como sobras no palco apenas marcas de uma civilização inútil: seus tênis nike, suas calças jeans e seus toscos pedaços de madeira. Só me interessa o que não é meu, lei do homem, lei do antropófago  

Na recente publicação A hora da micropolítica (2016), Suely Rolnik aborda as atuais estratégias de poder que já não se valem mais “da força militar, como era o caso até os anos 1970 e 1980, especialmente na América Latina, mas sim da força do desejo, ou seja, da força vital que move a existência individual e coletiva21”. E afirma que o que vem forjando os diferentes processos antidemocráticos em percurso nas últimas décadas são os vínculos com o inconsciente colonial-capitalístico. A partir das reflexões realizadas a respeito de cada um dos trabalhos da Trilogia Antropofágica é possível considerar que tais experiências inventaram procedimentos criativos que permitiram que corpos buscassem ser afetados a ponto de serem transformados em outros e experimentassem formas micropolíticas de retomar os princípios da antropofagia como modo de mobilizar uma potente bússola ética e estética capaz de produzir desvios às forças reativas de tal inconsciente. 

Seja pelo silêncio predominante em Acto I, pela presença da respiração ofegante de Acto II, ou através dos urros de Acto III, por intermédio dos impulsos que emergem 21 Suely Rolnik. A hora da micropolítica, São Paulo: Editora N-1, 2016, p. 03. 17 das coletividades instauradas em tais obras, que insistem em permanecer, resistir e ocupar, é inegável reconhecer que, como reflexo de um deslocamento vital, corporeidades e sonoridades foram afetadas durante uma operação antropófaga. O que o tríptico do Perro Rabioso explicita é que as forças que os movimentos coletivos produzem, sejam elas artísticas ou sociais, podem vir a fazer vibrar a realidade. Tal constatação encontra correlação com o que o historiador de arte francês Georges Didi-Huberman vem cogitando sobre a possibilidade das imagens e, também dos sons, serem considerados como forma de luta, uma vez que é necessário “aos nossos desejos, a energia das nossas memórias, à condição de nelas fazer agir uma forma, aquela que não esquece de onde vem e, por isso, se torna capaz de reinventar possibilidades22”. O que a operação de Tamara Cubas realiza é justamente fazer agir formas em experiências nas quais “voltam a emergir essas noções dentro de terrenos do pensamento da micropolítica23”. 

Se a última exposição de Didi-Huberman foi intitulada Levantes (2016), isso partiu do interesse do pesquisador em realçar a possibilidade de ruptura com a suposta previsibilidade da história. Não por acaso, na versão brasileira optou por apresentar uma das impressões originais do Manifesto Antropófago, no qual chama a atenção o seguinte trecho: “Perguntei a um homem o que era o Direito. Ele me respondeu que era a garantia do exercício da possibilidade. Esse homem chamava-se Galli Mathias. Comi-o24”. Aqui Oswald de Andrade realiza vários jogos de palavras ao destacar a escrita da palavra direito com letra maiúscula, e, por contraste, recordar ao leitor dos direitos escritos em letras minúsculas. Ao transformar a palavra galimatias em um sujeito, quando também faz menção a discursos verborrágicos e herméticos, o autor traz à tona que qualquer homem deveria ter a garantia de poder devorar seus direitos, assim como poder se desfazer das palavras para, enfim, exercer sua liberdade. 

Deixando de lado os discursos, a Trilogia Antropofágica se conecta aos saberes produzidos pelos corpos, dando forma e rosto às alteridades que compõem cada obra. Seja através da constituição de uma instalação na qual o público pode intervir, como no 22 Georges Didi-Huberman, Levantes, São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2017, p. 20. 23 Tamara Cubas, “Tamara Cubas toma el Teatro Solís”, Montevidéu: Gestión Cultural UY, 05 de dezembro de 2017. Entrevista concedida a Cinthya Moizo. 24 Oswald de Andrade, Manifesto Antropófago, São Paulo: Revista de Antropofagia, n. 01, 1928, p. 03. 18 primeiro ato, ou através de experiências que tensionam performance e dança, nos dois últimos atos, tais obras encorajam o exercício de outras possibilidades de estar no mundo e poder fazer isso coletivamente. É o que frisa Tamara quando diz que o que prioriza em suas criações são “experiências, acontecimentos com o público. Me interessa que pensemos juntos (…) os artistas, e o público. Compartilhamos perguntas, não respostas, nem pontos de vista. E isso consiste no político também25”. Portanto, na poética de Tamara Cubas o que se destaca é o desejo de um pensar com o outro, fato que se materializa para além das obras, aspecto fundamental do percurso criativo do Perro Rabioso, que se preocupa, prioritariamente, em articular processos de trocas. No caso da Trilogia, os laboratórios abertos realizados no início do projeto, bem como os períodos de imersão no Campo Abierto, além da finalização do último espetáculo em parceria com criadores em residência, revelam procedimentos éticos e estéticos que buscam, através do tempo-em-experiência implicar a convivência em tais práticas, e assim fazer germinar as possibilidades de inventarmos, juntos, outras formas de existência por vir. 

 1 Tamara Cubas, “O corpo como matéria de novas investigações”, Florianópolis: A Notícia, 27 de novembro de 2004. Entrevista concedida a Jussara Xavier. Referências Bibliográficas ANDRADE, Oswald de. Manifesto antropófago. São Paulo: Revista de Antropofagia, n. 01, 1928. CUBAS, Tamara. “El arte insertándose en la trama social y cultural fronteriza”. Rivera: La Jornada, 24 de outubro de 2017. ______________. “Ensayos escénicos”. Montevidéu: La culpa la tuvo Mano Chau, 06 de dezembro de 2017. Entrevista concedida a Gabriel Peveroni. ______________. “O corpo como matéria de novas investigações”. Florianópolis: A Notícia, 27 de novembro de 2004. Entrevista concedida a Jussara Xavier. ______________. “Tamara Cubas toma el Teatro Solís”. Montevidéu: Gestión Cultural UY, 05 de dezembro de 2017. Entrevista concedida a Cinthya Moizo. ______________. Trilogia Antropofágica. Lisboa: Teatro Municipal São Luiz, setembro de 2017. Programa da peça. DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia, vol. 1. São Paulo: Editora 34, 1995. DIDI-HUBERMAN, Georges (Org.). Levantes. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2017. 25 Tamara Cubas, “Ensayos escénicos”, Montevidéu: La culpa la tuvo Mano Chau, 06 de dezembro de 2017. Entrevista concedida a Gabriel Peveroni. Tradução minha para: “Experiencias, acontecimientos con el público. Me interesa que nos pensemos juntos (…) los artistas, el público. Compartimos preguntas, no respuestas, ni puntos de vista. En eso radica lo político también”. 19 EVELIN, Marcelo. Matadouro. Paris: Festival D ́Automne, 2013. Entrevista concedida a Stéphane Bouquet. FABIÃO. Eleonora. “Programa performativo: o corpo-em-experiência”. Campinas: Revista ILNX, n. 04, 2013. LEVINAS, Emmanuel. Totalidade e Infinito. Lisboa: Edições 70, 1980. LINS, Sônia. Artes. Gent: Snoeck Ducaju & Zoon, 1996. NASER, Lucia. Acto II. Resistir en el Cerro de Tamara Cubas. Montevidéu: Juntando Notas, 31 de agosto de 2016. ____________. Comemos lo que somos. Montevidéu: La diária, 12 de dezembro de 2017. ROLNIK, Suely. A hora da micropolítica. São Paulo: Editora N-1, 2016. _____________. “Antropofagia Zumbi”. In: CESARINO, Pedro; COHN, Sérgio; REZENDE, Renato. (Orgs.). Azougue – Edição Especial 2006-2008. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2008. _____________. “Subjetividade Antropofágica”. In: HERKENHOFF, Paulo; PEDROSA, Adriano (Ed.). XXIII Bienal de São Paulo – Arte contemporânea brasileira. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo, 1998. SOTER, Silvia. “No movimento da Piracema: reflexões sobre a prática de dramaturgista”. In: ESPÍRITO SANTO, Cristina; GREINER, Christine; SOBRAL, Sônia. Cartografia Rumos Itaú Cultural Dança 2012-2014. São Paulo: Itaú Cultural, 2014. Paola Lopes Zamariola é doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade de São Paulo. Investiga a cena latino-americana contemporânea, com ênfase para projetos que envolvem práticas artísticas e pedagógicas. Artista criadora do [pH2]: estado de teatro desde 2007, onde desenvolveu trabalhos como atriz, diretora e diretora de arte. É editora da Revista Aspas. 

Contato: 

paola.lopes.zamariola@gmail.com.  

A TRILOGIA ANTROPOLÓGICA DE TAMARA CUBAS: DESEJO E FEROCIDADE. 

Tamara Cubas (Montevideu,1972), uruguaia, tem uma história familiar que como outras da sua geração está marcada pelo que sofreu durante a ditadura uruguaia (1973-1985); Tendo partido com a sua família para o exílio em Cuba de onde só regressou em 1985. Menos falada que outras ditaduras latino-americanas, a uruguaia não foi por isso menos criminosa com um regime que usou a tortura, a prisão e fez desaparecer muitos opositores, entre os quais guerrilheiros tupamaros. A memória destes anos faz parte da biografia da coreógrafa e ela é assumida em muitos dos seus trabalhos, tendo inclusivamente dado origem a uma investigação no seio da própria família. Em Abril de 1975, desapareceu Omar Cubas, o tio de Tamara e de Leticia, irmão de Luís, de Mirtha, de Elsa, de Mireya, filhos de Elida, com a memória destes acontecimentos Tamara inicia, em 2009, uma série de acções em que ela e a família são os principais intervenientes, e, assim, vinte e cinco anos depois e já vivendo em democracia, os integrantes da família Cubas entregam a um juiz a declaração do desaparecimento de Omar Cubas. 

 Outras acções propostas por Tamara e realizadas pela família implicaram recuperar narrativas, cartas, rever relatos anteriores, ouvir testemunhas de Montevideu, em particular os protagonistas das experiências sofridas nos anos difíceis da ditadura cívico-militar que os uruguaios viveram entre 27 de junho de 1973 a 28 de fevereiro de 1985. E assim nasceu um arquivo familiar, de documentos recuperados, a par das primeiras acções performáticas de Tamara com o seu corpo e a sua linguagem física. 

 Há uma particularidade comum a estes trabalhos digna de nota. Não se tratou nunca de investir na criação de um fantasma do desaparecido, e, muito menos, de elogiar a vitimização, mas, como diz a própria Tamara, lembrar que a dor existiu, mas que, neste percurso há que construir o perdão sem o esquecimento que não permita um segundo desaparecimento. E mais: lembrar aos que sobrevivem o trauma do passado mas que este se torne consciente, que o elogio da vida deve impor-se à fragilidade que foi a vivência dos exílios. 

Deste trabalho moroso e permanente, resultaram obras cuja força dramatúrgica, a par de uma enorme fisicalidade, se tornaram marcas da sua linguagem como artista e performer. A obra Actos de Amor Perdidos (2010) que é parte de uma série de outras obras sob o título conjunto de La Patria Personal, é fundamental tanto no contexto uruguaio como de toda a América Latina, quando os artistas decidem relacionar-se com o passado, para o qual o álbum familiar funciona como a entrada que permite o acesso a esses passados próprios e ao das suas famílias, ao país e ao continente. Em Actos de Amor Perdidos Tamara recorre a um processador de anúncios electrónicos para que o público possa ler as estrofes do Hino Nacional do Uruguai, cobre o rosto com o esqueleto de uma cabeça de vaca para exemplificar o lado sufocante da ditadura, coloca em cena o seu pai Luís e recria com a sua tia Mirtha, que foi prisioneira política, a linguagem das mãos utilizada na prisão para comunicar por baixo das portas das celas. É um projecto de que resulta a revisitação dos anos da ditadura que tem como principais protagonistas os que a sofreram e, a par deste trabalho de rememorização, trata-se também de dar a ver que a memória é fulcral para continuar a viver depois do trauma e por causa dele. Para que isto funcione como performance, Tamara Cubas tem como mais-valia a sua formação e interesse tanto na cultura visual, quanto na performativa e um muito especial empenho no estudo da História. Outros trabalhos-acções mais recentes continuam a laborar neste processo como Quiero Minar la Tierra hasta encontrarte e Bordando desde el sur (ambos de 2015). 

Entretanto, em 2013 Tamara Cubas criava Multitud, obra In situ, uma peça para um número variado de intérpretes – dezenas na maioria das vezes – de idades, corpos, formações, treinos muito diversificados. A quase totalidade dos intérpretes era selecionada na cidade onde acontecia e o seu espaço de apresentação era público. Tamara partia para esta obra com um problema que podia ser enunciado tanto política como socialmente, ou performaticamente: como se conjuga a diversidade e a heterogeneidade de modo a possibilitar a convivialidade? Há preceitos para tal, e, a haver, quais são? Será que no colectivo se dilui inexoravelmente o individual? Qual é o papel, e o que esperam os intérpretes da coreógrafa e dos seus colaboradores directos? Esta será porventura a obra mais programática, no sentido político do termo, da artista. E, em cada lugar em que a obra acontece, o processo encontrado acaba por ser decisivo para o esclarecimento das questões que tomam, muitas vezes, soluções particulares e locais, sendo determinante que, da ideia inicial a toda a coreografia, que é o princípio de composição, tem sido substituída pelo da organização; em cena os intérpretes devem negociar e tomar decisões colectivas permanentemente. Daqui decorre que o ambiente é muitas vezes tenso mas permite que a obra seja acabada, participada e recebida pelas várias comunidades dos habitantes das cidades onde o processo acontece. 

 Entretanto, a questão da memória na sua dimensão mais ancestral a que se associa a colonização europeia, toma uma dimensão importante na obra de Tamara Cubas. De algum modo o trabalho e as acções sobre os arquivos, sobre o que um arquivo pode desvelar, esse trabalho de espeleologia material e imaterial condu-la ao passado pré-colonial, à tentativa de encontrar as primeiras formas e os primeiros gestos de uma ancestralidade nos territórios onde, hoje, ficará a região marcada do Uruguai e, assim, a coreógrafa cria Puto Gallo Conquistador 

 A estreia da peça foi um verdadeiro embate mesmo para os que eram espectadores habituais de dança, mesmo para os estudiosos das histórias dos colonialismos e, muito em especial, dos colonialismos impostos ao Novo Mundo, porque a obra exigia uma enorme disponibilidade. Impunha ao espectador desarmar-se ao máximo das amarras de espectador habitual e aceitar aquela estranheza vinda de um tempo e de um espaço demasiado antigo. Era aquele objecto inesperado na cena, aquela trouxa de trapos suspensa da teia como um orgão informe vindo de um passado mais que remoto. Depois eram aquelas cinco personagens vindas do mesmo tempo do objecto informe suspenso. A partir dali aqueles corpos produziam sons guturais de animais, ou de astros em formação, chegados de muito longe e criando um mundo sem lugar, um mundo onde o mais remoto passado co-habitava com o presente. Podia dizer-se que era a história da chacina colectiva dos índios “charruas” a par da destruição da natureza mas aqueles sons eram mais que isso porque eram prenúncios do que haveria depois de acontecer na colonização e vinham do mais ancestral que existe desde que existe vida, carne, sexo, ferocidade, nascimento, cópulas, morte. Era a própria terra a gritar de dor, a mesma dor dos corpos que foram dizimados e violentados e, depois, desapareciam sob os escombros de um manto de cinzas consequência da catástrofe que foi para os habitantes ancestrais a colonização. E daquela terra, apenas ficou no final a performance atlética e habilidosa de um dançarino de ‘malambo’, ou seja, na sua aparência até o colonialismo pode apresentar-se como elegante. 

 Agora com a Trilogia Antropofágica Tamara Cubas insiste no inquérito à colonização e de uma forma ainda mais subtil, porque aborda em simultâneo o que constituiu um grito de emancipação já pós-colonial – a partir do Manifesto Antropofágico de Oswaldo de Andrade – e as obras que já decorrem da existência deste gesto e da identidade que o mesmo produziu no Brasil, para ela própria se apropriar dessas obras num ritual de antropofagia funerária pelo qual o que é comido vai integrar e revitalizar a vida do que comeu. A trilogia é composta pelas obras: Acto I – Permanecer/ obra digerida: Vestígios de Marta Soares, Acto II – Resistir/ obra digerida: Matadouro de Marcelo Evelin, Acto III – Ocupar/ obra digerida: Pororoca de Lia Rodrigues. A apropriação que a coreógrafa faz destas obras da Trilogia são conformes ao método e à postura artística conhecida como antropofágica que decorre do referido manifesto artístico com o mesmo nome escrito no Brasil em 1928 como corte epistemológico e metodologia identitária para artistas modernistas brasileiros, mas que cedo foi tomado por uma grande maioria de artistas sul-americanos. 

 Mas o que é inovador e inesperado é que a coreógrafa não continua este processo ou este método, conforme a postura inicial do manifesto, mas avança para uma radical forma de criação e de postura política que se traduz em canibalizar o que antes tinha sido o canibal, ou seja, não permanece na história linear da antropofagia mas cria uma ruptura maior que é uma forma de dizer que, afinal, as consequências da primeira antropofagia já teriam perdido a sua energia inicial, já não apresentavam nenhum acto iniciador e teriam perdido a rebeldia e contudo, estas três obras são fundamentais do reportório latino-americano e universal contemporâneos. Mas os actos de vanguarda ou de rebeldia que se tornam factos históricos tendem a tornar-se enunciados abstractos, elegias, neste caso, e acabam por se tornar distantes da vida de hoje, da vida comum, da realidade que nos afecta no tempo e no espaço em que vivemos. 

 É para superar esta perda de intensidade que a artista envereda por uma outra estratégia de espectáculo. O que assistimos ao ver Permanecer, uma performance de longa duração, e à intervenção dos espectadores na peça e sobre uma coisa de carvão que ocupa o lugar da areia que constituía a matéria da obra inicial que os espectadores, cada um à sua vez, podem ocupar e permanecer sobre este chão que treme e, que tem a particularidade de criar uma instabilidade permanente. Haverá metáfora mais forte do que estas cenas que falam da solidão no meio da sujidade do trabalho duro, da instabilidade geo-política dos países sul-americanos? E já agora de todo o mundo? E, mesmo assim cada espectador que sobe para o monte de carvão quer dizer que ainda não desistiu, quer dizer que reivindica uma intervenção, um papel na História e por isso resiste enquanto a terra treme. 

 Na segunda obra, Resistir, o que é desde logo evidente é a forma como os intérpretes se apropriaram da energia de Matadouro a obra de Marcelo Evelin que é digerida. Na criação e estreia deste espetáculo o cão escolhido foi o Cimarrón, raça que chegou domesticada ao Uruguai com os colonizadores da região, mas que durante a conquista do território se escapou, tornando-se selvagem. Nesta peça uma energia vai crescendo, uma energia que parece não ter fim. Sobre um chão de pedaços de madeira amontoados, sobre um chão em desconstrução vai evoluindo a obra: a energia leva os bailarinos – e nós com eles – a uma situação de exaustão. Não há descanso, não há repouso; apenas breves episódios de encontro físico ou desencontro rompem por momentos para que apareçam figuras grotescas na corrida destas personagens sem destino claro. No final entendemos que Resistir é uma obra que procura o animalismo e a sua ferocidade, talvez a única prática de resistência ao sufoco do poder manipulador, à mercantilização, à capitalização do corpo, à domesticidade imposta pela institucionalização dos poderes. 

 A propósito da antropofagia que é o preceito de criação destas peças diz-me a coreógrafa: ” Estou convencida de que o Outro, o que é comido, nos modificou, as peças que comemos estão ali, feitas, podemos identificá-las nas que criámos. Vestígios, Matadouro e Pororoca estão ali, mas já não são mais as mesmas e eu jamais pensei que chegaríamos onde chegámos. Na verdade eu sinto que me modifiquei. Estou convencida de que conseguimos chegar àquilo que é não ser mais elas e também não sermos mais nós próprios, de termos sido modificados pelo Outro”. 

 Ocupar, o terceiro acto desta trilogia, acontece num palco atravessado, em parte, por um muro de tábuas que provém da cenografia do Acto II. O muro construído pelos bailarinos sem o recurso a nenhum prego é um obstáculo, uma barreira incómoda ali no meio, estorvando, condicionando os movimentos dos intérpretes mas é muito mais do que um objecto cenográfico. Na verdade funciona como uma personagem fechada, como um enigma com o qual os bailarinos terão de contar, de assumir ao longo de toda a obra. Dada a relação que os performers estabelecem desde o início com o muro- embate, erotização, protecção – ele mantém um ambiente de suspense em que a obra decorre. Ocupar é o trabalho mais dançante, mais bailado de toda a obra de Tamara Cubas. Embora sabendo que todos os trabalhos da artista são de um enorme rigor, em Ocupar até podemos ousar falar em coreografia no que diz respeito a muitas partes desta obra. Coreografia mais festiva no início e mais virulenta à medida que a obra vai acontecendo. Sabendo que Ocupar é uma peça que come Pororoca da Lia Rodrigues na qual o conflito é o tema da mesma – conflito das águas do rio negro e do rio Amazonas, conflito político do Brasil, conflito de classes, etc – não pode surpreender que o conflito esteja presente em Ocupar, presente até um grau elevado de violência. Acresce que Ocupar é a terceira e última obra da Trilogia e que o conflito já existia de um modo latente nas duas obras anteriores. Aqui o conflito torna-se claro, aqui o conflito explode! E ninguém escapa porque todos são envolvidos e todos são responsáveis. Ocupar é também a grande confirmação da qualidade dos performers que trabalham com Tamara, do seu virtuosismo, da sua fisicalidade expressiva e diferenciada e da sua enorme criatividade.

Antonio Pintos

THE CHOREOGRAPHY OF HISTORY AND BELONGING IN TAMARA CUBAS’ WORKS

In contemporary dance, the interest in discussing the history and present of colonialism and nationalism has increased in the last decade. This has led to new aesthetic and political approaches, and also to dialogues, cooperation and disagreements with other dance traditions such as folk dances. Often dialogues have turned into disputes concerning the legitimacy of dancing issues related to national or local identities. In Uruguay, where the national history has been culturally and racially whitewashed – racial diversity being underrepresented in the collective imaginaries about the Uruguayan population – the entrance of these topics on the public arena of debates is an important moment which represents significant transformations in political subjectivities and their ways of expression; both inside and outside the artistic field. 

Tamara Cubas is co-director of the collective Perro Rabioso (meaning “raging dog”). Born in Uruguay, she followed her parents’ exile during the Uruguayan dictatorship (1973-1985) and as a consequence she grew up in Havana before coming back to her homeland. A long-duration project, La Patria Persona, demonstrates some of the characteristic traits of Cubas´work: the indiscernible tie between the personal and the public, the political and the aesthetical, the personal and the national, the public and the private. But also the non-dissociative way in which she thinks the proper and the alien, focussing instead on the complex relations between their components. Through an appropriationist aesthetic, Cubas choreographically approaches issues related to national and personal identities, undoing them and reframing some of their main components in an intercultural and transhistorical tissue of references. For instance, in Actos de Amor Perdidos (2010) and Puto Gallo Conquistador (2014), many references to the past are brought up through a benjaminian frame that looks at the ruins of history – instead of at its monuments – and which attempts to build critical non-hegemonic narratives about the past, feeding the present through a contemporaneous practice of memory. While AAP delves into the symbolic realm of nationalism and homeland, PGC intends to think about colonization from the figure of the conqueror and the (im)possibilities of facing him up. The complexity of this confrontation and deconstruction has to do with the transformations of the colonial regime over the past centuries and its mixing with other forms and agents of power which strenghtened its resilience and reproduction, reproducing at the same moment subalternity. 

 The questionless “other” in me – thought by authors such as Jean Luc Nancy, Emmanuel Levinas, Maurice Blanchot, Jacques Derrida, among others – is easy to identify as far as the foreign, the conqueror, the enemy are involved. But the issue gets more complex when the questions are oriented towards that blurry line where the “me”, the “we” and the “them” are impossible to fathom, and are no less frequently taken for granted. Cubas´ works not only try to think about the “others” who are constructed by hegemonic forces, but also the “others” of the self-empowering, decolonial processes too often lead by local, white, heterosexual, middle-class, cultural elites. 

Stirring the ruins: Actos de Amor Perdidos 

 Most of Perro Rabioso´s work presents explicit references to contemporary politics, addressing the implications of military coups, repression, democracy´thresholds, Uruguayan identity, colonialism and pan-Latin Americanism. 

Mixing references to icons of local cultural identity with scenes and materials borrowed from other choreographers´ pieces, Cubas proposes alternative ways of thinking the relation with the “others” (other as colonizers or as dictators), no longer conceiving this “others” from an unsurmountable distance but on the contrary, as being an inherent part of the self. Actos de Amor Perdidos is a piece that integrates the project LPP, an archive practice in which memory is exercised simultaneously from the personal, the public and the political realms. The piece was created one year after a referendum took place in Uruguay concerning the implementation of the Amnesty Law on dictatorship crimes. As Cubas’ family was directly affected by the imprisonments and disappearances under the military regime, this resolution prompted her desire to build her own personal history, her personal homeland. 

AAP is a statement about the impossibility of leaving the past behind, about its continual reappearance, and about the need of questioning the relation with it as a way of knowing oneself. 

The past comes back as a specter that refuses to go away: LPP has no interest in documentation as truth, or in the objective transmission of facts, but rather in finding sensible ways of relating with reality, building a transitable base of documents which could be open to different readings, as a way of understanding and intervening in the past. The piece is well described through the term proposed by Eleonora Fabiao when she talks about the principles and methodologies of a “performative historiography”; a way of making up a precarious history which departs from the ruins, from the fragments, from the vulnerabilty of what can never be accessed completely (2012). 

 Mixing references from the national past, the personal-family past and the past of contemporary dance, Cubas creates a complex tissue of memories presented in subsequent acts. Family prison experiences, repression codes, military ways of censorship and persecution, Cubas´ real family counting the disappeared people, the use of a clandestine hand-language made up in prison to communicate between cells. Along the piece, the acts that explicitly address issues from the political past are mingled with others consisting in fragments of other dance pieces: ATP from Cubas, Braindance from Gilles Jobin, Laughing Hole from La Ribot, etc. Thinking of the past as something permanently being built in the present, Cubas is interested in a way of thinking the archive as a practice. This practice is organized within a dramaturgical structure that resembles a photographic album: each page makes us access memories of different kinds, some of themare recognizable in their collective manner, others may awake empathy but belong to the artist´s personal archive. The dancers mingle with the technicians who also enter and exit the stage, participating in the preparation between scenes but also making part of the choreographic action. This blurring of the difference between the performance and its making, between the performers and the rest, posits a metalinguistic reflection about who are recognized as main characters of history and who are those (workers in this case) who make history run but are often made invisible or excluded from it. 

 Looking at the conqueror´s face: Puto Gallo Conquistador 

 If in LPP and AAP Cubas delves into the personal and local pasts and presents focusing mostly on the Uruguayan dictatorship as foundational event, PGC sees cultural identity issues in a colonization-perspective. 

 There are many artists interested in exploring and staging issues related to the past and present of coloniality. In dialogue with authors such as Andrade, Hardy, Mignolo or Rolnik, Cubas understanding is that colonization, up to this stage of its development, creates a perspective, creates orders and determines game rules to which certain indigenous populations were able to adapt while others were anihilated because they did not submit to them, such as in the Uruguayan case. The questions posed by Cubas and others interested in deconstructing colonial power regard the fact that all too often, the self-imagination of the colonized tends to reproduce the colonial gaze. The historical character of that cultural dynamic points out the relevance of thinking about colonialism in the present. PGC delves into these questions on the past and present of colonization processes: through an ambiguous aesthetic the bodies grow from the indigenous stereotype´ representation to a monstrous border in which the “human” loses its form. Colonization and civilization are not cast as antagonistic in this piece but are implicitly thought as accomplices. The colonizer civilizes as a way of possessing and also of being able to classify and legitimize/de-legitimize the “others”. In its self-recognition processes, the colonized replicates or discusses these parameters of inward and outward recognition. Cubas proposes a critical perspective which manages to challenge the many introjected forces of colonization. 

 Recently many pieces have revealed the way in which the self-understanding and identity of the colonized tends to replicate the image that the colonizer has imprinted In the case of PGC the initial image suggesting the presence of Charrúas works as a bait that is immediately taken away and turned into another thing. The beginning makes us remember this extinct tribe, which in Uruguay represents a hidden part of the national history due to a whitewashing process which invested in the imaginary of the nation as European. Differently from countries such as Brazil or Argentina, where racial and ethnic diversity are part of contemporary life, the extermination of the native population in Uruguay makes the non-European history of our culture and society almost invisible. 

 The bodies in PGC appear statical before they turn into animal guttural uncivilized presences that seem to be taking everything with them once the tremors begin to take place. The piece consists of the constant emergence of movement patterns that instead of developing continuously, are constantly replaced by new ones, negotiating between the collective contagium and the individual dissent. The five performers – Natalia Viroga, Javier Olivera, Santiago Turenne, Maite Santibañez, Sergio Muñóz – compound a group by force of aggregation and similarity, but not of coordination or agreement. The group does not achieve any concerted action: their “we” is a shared time-space more than a shared identity mark or a clear cohesion bondage. While the relation among them is dehumanized, the choreography is based on animalized movement, trance, collective rituals of possession. Destruction, disappearance and reemergence seem to be key words to describe the discourse and metadiscourse of the piece. 

 The theatre is covered by a huge scenography which amplifies the difference in scale of the human body when compared with architecture, magnifying the submission of human individual strength in front of imperialist constructions (the theatre being one of them). After the initial scenes are performed by this quadruped and unclassifiable group, the ground begins to show its instability which will increase until the bodies go underground. The piece ends up with the destruction of the scene from below. After a spectacular fall of the theatre ceiling and of the black box in which most of the piece has developed, we witness the re-emergence from below of these bodies who now carry aphasic expressions and lost gazes. 

Being comissioned by a Portuguese curator, this piece reflects on colonization from an understanding of “the proper” as a hybrid flux of experiences more than a stable entity or identity. “I´m only interested in what is not mine” says the most famous statement of the Anthropophagus Manifest (Andrade 1928). In PGC ethnic and historical icons move in a dry sea of tissue and are reinscribed in a dynamic stage which changes its shape, bodies and functions: from being a ground it becomes a hideout; from static and exhibitionist bodies they become almost monstrous beings, or as if in trance, deprived of language or articulation; from the cowboy tradition of boleadoras to the electronic beat of the soundtrack, and from the ancestrality of the assasinated indians to the present condition of these contemporary bodies. PGC seems to perceive that colonization will not be over through the affirmation of national belongings nor through national identities but that it can be deactivated or re-actualized in the narratives we build about our past and present. Ambiguity is then a concept that better characterizes the space where colonialism (and the attempts of deconstructing its forces) works today, being no longer possible to trace clear boundaries between colonizers and colonized, subjects and powers, dominators and dominated. However the task of thinking about them is a responsability that does not dissolve in this ambiguity and paradoxes, but must be responsabily carried forward into the future. PGC is not interested in defining nor defending a national or closed “we”, is not relying on the affirmation of a Latinoamerican or Uruguayan identity as a way of challenging the colonization powers. Perceiving that those same delimitations are traced in a way that favours the isolation of the conquested as the “other” of the European and civilized “we”, Cubas piece inhabits an ambiguous territory in which the exclusionary logic is replaced by the devorative, “anthropophagic” dynamic: it eats the enemy as a ritual of assimilation of what is not “proper” and in that way produces the expansion of the proper beyond the area delimited by the dominant forces. 

The devoration of references and strategies gives place to an eclectic and sometimes chaotic language, in which the mix of ingredients, temporalities and discursive logics are sampled to give way to complex and unclassifiable configurations. 

Two choreographic ways for an endless reinvention of histories: experience and fiction as historiographic strategies. 

PGC  While AAP brings different significative symbols to compound a heterogeneous universe of discontinuities, PGC creates diverse significations from the proposition of a fictional universe. While in the former we see discontinuity, break of representation and a rough, performative and non metaphorical relation to the historical and mnemorical materials manipulated; the latter invites us to enter a distorted reality through a choreographic, scenographic visual and auditive intervention. PGC also excludes – differently from AAP – the possibility of the audience participation in the development of the action. 

PGC is a closed system built up over the foundations of theatrical conventions and a unitary structure as a (dance) piece, while AAP is explicity a discourse that works through contiguity, through difference – through dissipation as Foucault (1972) would say. 

 In AAP we can access different cells of Cubas´ memory. They are organized in a way that suggests their belonging to a wider group; to the endless realm of memory practice and reinvention. In PGC a certain cryptic and ominous atmosphere encloses and frames during almost the entire piece the events and bodies which take place. However, in the end this frame breaks down and oppresses and hides the bodies of the performance. Then the setting becomes alive through the underneath movements of the humans now confused with and within the scenographic structure which one moment ago was framing the representation. The mutation of these bodies after being eaten by or having ate their own (fictional) world, suggests the change of the previous order that becomes another after the dissappearence of the distance between subjects and objects. Both bodies and stage lose their recognizable form to turn into others: those are the others that this work searches for. 

 The purpose of approaching these two pieces and facing their ways of thinking on the power relations implicated in personal, national, aesthetic “pasts” and presents, is found in their intimate dialogue with history and the critical mode of historiography they perform through different arrangements of documents, relations, bodily explorations, etc. If their procedures and questions are different, we may also recognize a shared profane and profanative practice of historiography which is interested in reactivating the pasts more than in storaging them. In Cubas´ work the archive is not to be fixed and saved but to be kept alive. 

 In a text about LPP Cubas writes: 

Maybe the archive can be a way of establishing some sort of relation with that past full of situations, acts, and passages that are generally excluded, although the desire of relating with them remains, reappears and insists. (…) the gap which mediates between reality and its representation through language or image is acknowledged, opening different possibilities for representing the real and its memories. 

 The archive is therefore a way of relating with the past, all the while considering the appearances that it produces in the present. The logic which organizes the archive of AAP is affective and not scientific, is historical but not objective, is personal but not for that reason private, is not worried about originals because it looks at history as a dialectical process of self-transformations and recycling. 

 If following Foucault in The Archeology of Knowledge we consider that the archive is something that does not store but acts, and that it is not some sort of deposit but a system, and that history is what comes out of the construction and organization of archives, choreography seems to be a promising way of relating with it. Among other things, in Tamara Cubas and Perro Rabioso´s work we see how contemporary dance, while it has grown away from its appropriation by the nation-state and its ideological forces, has not given up its participation in the reflection on the formative processes of national cultural identity, and the extent to which the nationalist matrix attaches bodies to places. 

 Lucía Naser is a dance artist and researcher at the Museo de Arte Contemporánea de Montevideo. She is currently also a PhD candidate at the University of Michigan, US. 

 [1] To read more about LPP in Perro Rabioso´s web access: http://www.perrorabioso.com/node/2576. [2] In an article on the will to archive and reenactments – so in vogue in contemporary art of the present-, André Lepecki discuss that this will is not mainly impulsed by a nostalgic need to re connect with the past but most of all this desire refers “to a capacity to identify in a past work still non-exhausted creative fields of “impalpable possibilities” (…) these fields that “concern the possible” (Massumi 2002, 93), are always present in any past work and are that which re-enactments activate. ” (Lepecki Will to Archive… 31). Going back to look forward, this piece performatively questions the legitimacy of those authorized as history makers and tellers and also the standards by which history is considered as true of false, as private or public, as personal or political. “I create images so the public can relate with them from their own universes” says Cubas and extending this choreographic invitation to us. [3]From now on “AAP” for Actos de Amor Perdidos and “PGC” for Puto Gallo Conquistador. [4] Release and press available in: http://www.perrorabioso.com/PutoGalloConquistador. [5] To name a few among many: Marcelo Evelin (Matadouro, Bull Dancing, De repente fica tudo preto de gente), Lia Rodrigues (trilogia Pororoca, Piracema y Pindorama), or the southafrican Robyn Orlin (At the same time we were pointing a finger at you, we realised we were pointing three at ourselves…). [6] Charrúas were a tribe of american indians who originally inhabited the territories now known as Uruguai, the Argentinian provinces Entre Ríos, Santa Fe and Corrientes as well as the Brazilian state of Río Grande del Sur. [7] The Anthropophagic Movement comes to life in 1928 through the publication of the manifest written by Oswald de Andrade in the Revista de Antropofagia in San Pablo, which took up debates already raised during the Semana de Arte Moderna (1922) in which many intellectuals claimed for a reevaluation of brazilian identitity, departing from the methaphor of cannibalism. This methaphor signals the way in which the primitive, the amerindian, the civilized cannibal and the actual brazilian devores the alien cuture and appropriates it, transforming it at the same time without guilt. [8] Source: http://www.perrorabioso.com/node/2576. 

Bibliography 

Andrade, Oswald. “Manifiesto Antropófago” Revista de Antropofagia, Año 1, nº 1, mayo 1928. In: Teles, Gilberto Mendonça. Vanguarda européia e modernismo brasileiro: apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas. 3ª ed. Petrópolis: Vozes; Brasília: 1976. Benjamin, Walter. The arcades project. Translated by Howard Eiland and Kevin McLaughlin. Cambridge, Mass.: Belknap Press of Harvard University Press, 1999. Blanchot, Maurice. The unavowable community. Translated by Pierre Joris. Barrytown, N.Y.: Station Hill Press, 1988. Burt, Ramsay. “Memory, Repetition and Critical Intervention: The Politics of Historical Reference in Recent European Dance Performance”. Performance Research 8 (2): 34–41, 2003. Derrida, Jacques. Writing and difference. Chicago: University of Chicago Press, 1978. –, The Politics of Friendship. Trans. George Collins. Verso. Brooklyn, 2005. Esposito, Roberto. Communitas: the origin and destiny of community. Translated by Timothy Campbell. Stanford, Calif. : Stanford University Press, 2010. –, Terms of the political: community, immunity, biopolitics. Translated by Rhiannon Noel Welch. New York: Fordham University Press, 2012. –, Immunitas: the protection and negation of life. Translated by Zakiya Hanafi. Cambridge, UK; Malden, MA: Polity, 2011. Fabiao, Eleonora. “History and Precariousness: in search of a performative historiography”. En: Jones, Amelia and Heathfield, Adrian (Eds.) Perform, repeat, record: live art in history. Bristol, UK; Chicago: Intellect, 2012. Foucault, Michel. The Archaeology of Knowledge. Translated by A. M. S. Smith. New York: Pantheon, 1972. Lepecki, André. “The body as archive. The will to reenact and the after-lives of dances”. Dance Research Journal, Volume 42, Number 2, Winter 2010, pp. 28-48. Lévinas, Emmanuel. Ethics and infinity; conversations with Philippe Nemo. Translated by Richard A. Cohen. Pittsburgh: Duquesne University Press, 1985. Nancy, Jean Luc. La Comunidad Inoperante. Traducción de Juan Manuel Garrido Wainer. Santiago de Chile Escuela de Filosofía Universidad ARCIS, 2000. Negri, Toni. “Para una definición ontológica de la multitud”. Revista Multitudes nº 9, pp. 36-48, Paris, 2002. Perro Rabioso. Web: http://www.perrorabioso.com/node. Rolnik, Suely. “Beyond the Identity Principle: the Anthropophagy Formula”, Parkett, nº 55, 1999. –,“Antropofagia zombie”, Brumaria, nº 7, 2006. (Artículo). Available in:http://www.pucsp.br/nucleodesubjetividade/Textos/SUELY/Antropzombie.pdf. Schwartz, Jorge (org). Da Antropofagia a Brasilia: Brasil 1920-1950. Sao Paulo: FAAP Fundaçao Armando Alvares Penteado e Cosas & Naify Ediçoes, 2002. Serie “Do surrealismo à Antropofagia” Eduardo Subirats. Spivak, Gayatri. “Can the subaltern speak?” In Marxism and the interpretation of Culture. Editado por L. Grossberg y C.Nelson. Urbana: University of Illinois Press, 1988. Teles, Gilberto Mendonca. Vanguarda Europeia e Modernismo Brasileiro Apresentacao e Critica dos Principais Manifestos Vanguardistas. José Olympio, Río de Janeiro, 2012. 

http://www.seismopolite.com/the-choreography-of-history-and-belonging-in… 

 Tipo: Crítica  / Autor: Lucía Naser  / Medio: Seismopolite  / Año: 2015

“Entre el fracaso de la imagen y la apuesta al movimiento” 

En la relación con tres términos que se juega entre una imagen, su objeto (que construye la vista) y su sujeto (que construye la visión de todo), uno encuentra siempre esta necesidad estructural de la posición. 

 Georges Didi-Huberman 

En la actualidad resulta tan complicado como fútil intentar establecer los límites que distinguen unas prácticas artísticas de otras. En principio, porque los desplazamientos que éstas han tenido en los últimos cincuenta años han traspasado no sólo los terrenos propios de cada disciplina, sino que tales prácticas han incidido de manera aguda en el orden social. Probablemente, este alejamiento de los territorios artísticos sea la razón por la cual algunas piezas artísticas pudieran ser descalificadas o simplemente rechazadas desde su campo específico. 

El trabajo de la artista uruguaya Tamara Cubas se ubica justamente en este intersticio y para algunos, su obra transita en los bordes de las artes escénicas y las artes visuales. Hay quienes la considerarían como coreógrafa, bailarina, performer, directora de escena y al mismo tiempo, como artista visual. En principio, debido a que su formación profesional abarca claramente esos campos y también porque su obra se desplanta desde dos fundamentos básicos: la fuerza de los cuerpos y la potencia de la imagen. Esto resulta más claro si reconocemos que su investigación artística siempre se orienta hacia una visualidad y una materialidad particulares que pueden ser observadas, lo mismo en la espacialidad escénica de la caja negra que en la nitidez de la caja blanca museística. 

En sus piezas coreográficas es posible advertir el tratamiento del espacio como una unidad sonora y lumínica en la que los cuerpos construyen una composición visual en movimiento, cercana a la pintura. Mientras que en sus instalaciones, videos y acciones son el cuerpo y su gestualidad la materia escénica con la cual se reflexiona de manera subjetiva un acontecimiento político, social o histórico.

Tamara Cubas es más bien una artista contemporánea y en todo caso, podría decirse que una parte importante de su producción comparte códigos, formas y estrategias vinculadas con la visualidad y el movimiento; desde luego no debe pensarse que el movimiento y la visualidad referidas pueden reducirse a la sencilla idea de la imagen de un cuerpo se mueve en el espacio hechas para la visión de un espectador asignado. Más bien habría que reconocer en las imágenes de Cubas un marca de inestabilidad y emancipación de las categorías de clasificación que demanda a quien las mira la necesidad de tomar una posición para ponerlas en movimiento, para movilizarlas. Los cientos de stills fotográficos de cuerpo vivo que se desploma innumerables veces frente a la cámara siniestra de un fotógrafo no sólo son poses a través de las cuales comprobamos que un cuerpo vivo nunca caerá como uno muerto, son también “pausas”, detenciones imposibles del tiempo: un ejercicio corporal que pretende hacer de ese fingimiento un saber visual. En este caracter épico Tamara asume incluso el “fracaso de la imagen”, intentar huir de la frustación y su cauda de imposibilidades es su “apuesta en movimiento”.

Eduardo Bernal  

Lo colectivo en tamara cubas

Procedente de una familia de militantes de izquierda que fueron perseguidos durante la dictadura militar (su tía fue presa, su tío desaparecido y su padre tuvo que exiliarse en Cuba), el hallazgo de una foto que sobrevivió al encarcelamiento de su tía, vivir de niña el desmembramiento de su familia y de su sociedad producido por las desapariciones y por el número de personas que se exiliaron por esta causa, le motivó a indagar en el pasado familiar, compartir anécdotas y su quehacer artístico con sus parientes, así como interesarse en la dicotomía entre lo personal y lo colectivo, y en los resortes que mueven a la colectividad. ¿Cómo abordar lo que no se había querido hablar? ¿Cómo escapar de la victimización? Las respuestas a esas inquietudes tienta encontrarlas a través de ejercicios de construcción de la subjetividad y surgen series como “Cartografías”: fotos de lugares, relacionados casi todos a la clandestinidad, que dejaron una huella en sus familiares, acompañadas por la explicación escrita que ellos le dieron. A partir de los recuerdos que tenían, Tamara lleva a cabo una búsqueda en los diarios de la época y realiza otra serie integrada por la foto individual de cada uno, sosteniendo una palabra que connote su experiencia y la sostengan a nivel del pecho a modo de identificación. Con ambas series conforma la “La patria personal” que da pie a acciones, a una obra escénica y a la exposición “El día más hermoso” en el Museo Blanes en el 2012, integrada además por el collage fotográfico “Caídas” y el storyboard “Escenas para una película”, video que recrea la tensión de la mano de su tía cuando describe con trazos su vida en presidio sobre el documento que certifica su estadía allí. En otra sala varias pantallas leds reproducen frases extraídas de las cartas intercambiadas entre su padre y su madre que hablan del compromiso y la utopía que dio sentido a sus vidas. Al fondo aparece la carta de la tía Mirtha en gran formato, escrita con carbón en la pared, de la que extrajo la frase “el día más hermoso aún no lo hemos vivido”. Amén de la poesía de la frase, llama la atención que su tía se exprese en plural, como parte de un colectivo, y aluda a un mañana mejor que debe llegar, mientras, refiere Tamara, hoy en Uruguay y en otros sitios, se piensa sólo en el presente y la idea de colectivo varió. El contraste entre la noción de colectivo ayer y la que se tiene hoy dio lugar a la performance “Multitud”. 

 Tamara estudió Artes Plásticas en el Instituto Nacional de Bellas Artes de la Universidad de la República y la Maestría en Arte y Tecnología en la Escuela de Artes de Utrecht, Holanda, en paralelo a Danza Contemporánea, cursada en la Escuela de Contradanza de Montevideo y en talleres impartidos por danzarines de fama. Aunque adiestrada en los dos lenguajes, me parece lógico que acudiese a recursos y expresiones de las artes visuales que comportan un carácter testimonial, como la fotografía, el video y el documento, para recrear su pasado y realizar ejercicios de construcción de la subjetividad. No obstante, ella luego confesará el asombro que le provocara el congelamiento o fijeza de las obras en sala, representaciones escogidas quizás de modo inconsciente para abordar el carácter inamovible del pasado: los hechos fueron así y son imposibles cambiarlos. 

Los cursos de danza le mostrarán la posibilidad de construir metáforas a través de la potencia del gesto y la expresión corporal, que escenifiquen sus interrogantes sobre el presente: ¿dónde está ahora el cuerpo colectivo? ¿Cómo representar este y el individual? ¿Es posible movilizar por la experiencia en sí misma y no por compromisos asumidos? ¿Cómo poder expresar la indiferencia o por el contrario la solidaridad? ¿Cómo nos organizamos? Indaga sobre los conceptos de pueblo, multitud, muchedumbre en los textos de Paolo Virno y Tony Negri y acerca de sus opiniones sobre el cuerpo individual y su relación con el colectivo, y ya apertrechada de nuevas ideas decide hacer una obra sobre ese ente poderoso y poliédrico que es la multitud. La pregunta estético-sociológica sobre aquello que relaciona lo colectivo con lo individual sigue en pie. Es curioso que cuando Tamara trabaja con el presente, con los valores puestos en conflicto en las dos últimas décadas y se plantea cómo expresar la forma social del hombre contemporáneo, la heterogeneidad en el colectivo, las relaciones interpersonales, las posiciones discrepantes en la esfera pública, descarta la obra estática (antes destinada a abordar el pasado) y pasa al dinamismo de la performance colectiva. Pero lo hace de forma novedosa, cambiando los conceptos de coreografía y composición por parámetros de organización interna, lo que le permite ejecutar la performance con un número variable de personas. “…Hoy en día en el arte vale todo, uno puede usar lenguajes e instrumentos de todo tipo. A mí me interesa que el arte dialogue con la contemporaneidad, y eso se ve más que en los contenidos, en las herramientas que utiliza… ya Walter Benjamin en 1929 pedía un cambio al artista en su forma de producir y no en sus proclamas. Creo en el arte como una forma de relación, el hecho de trabajar con mi familia se puede leer en ese sentido… lo que me interesa es un arte que cuestiona la relación con el “otro”…Me interesa cuando el arte pierde su aura, su distancia con el público”. 

 “Multitud” se estrena en México, en sala, en 2011, gracias al Premio Iberescena, con 17 integrantes y el sonido amplificado producido por los bailarines, y en 2013 en Montevideo en el espacio público, lugar natural de la muchedumbre, con más de 50 y música de Francisco Lapetina manipulada en vivo. Al igual que en su obra expositiva, en sus performances colectivos Tamara es un sujeto ausente, en off, cuyo rol es movilizar y dirigir a la multitud. Pero escenificar su comportamiento implica propiciar una sinergia entre los participantes que traiga reacciones en cadena y “los obligue a tomar decisiones colectivas constantemente sobre el camino a seguir y cómo cada cual lo transita”, trasladando a los intérpretes la decisión sobre los momentos en que deben producirse los cambios en la coreografía. 

En La Habana, la música de Lapetina ambientó nuevamente la presentación de “Multitud” en el tramo de calle donde está la sede del teatro El Ciervo Encantado, rodeado por los espectadores, sentados, o de pie en las aceras y en los extremos del pavimento, en una cercanía que hacía que los límites entre estos y los performers no quedaran tan claros. Miembros de las Escuelas para Instructores de Arte, de las de Danza de la Escuela Nacional de Arte (ENA) y del Instituto Superior de Arte (ISA) –hoy Universidad de las Artes– y del Conjunto Folclórico Nacional actuaron de performers vestidos con la ropa que usan a diario. Como en las anteriores, la pieza se inicia con la calle vacía, poblada poco a poco por los participantes, quienes van armando una especie de máquina humana viva, en movimiento. Una escultura móvil que interpretó los signos vitales de la multitud: despertar, aprender a sostenerse y caminar, entrar y salir, transitar senderos, situaciones antagónicas como caer o evitar la caída del otro, mirarse, agarrarse y entrar en comunión o repelerse, contagiar sensaciones como la risa o, por el contrario, el miedo y huir despavoridos, y también gritar, expulsar, llegar al estallido, quitarse todo, probar al otro, intercambiarse, despojarse, arrastrarse y caminar en cuatro patas, hasta llegar a ser uno solo, una masa semejante a una medusa que intenta la utopía de mover montañas... En estos tránsitos hay momentos cumbres que otorgan densidad a la dramaturgia coreográfica como cuando corren en círculo a gran velocidad, o reptan y se vuelven rastreros, y luego saltan y caen violentamente al piso, y después estallan en gran hilaridad. Son instantes en que la multitud parece incontrolable, en que el encuentro con el otro los moviliza, para luego terminar todos fundidos en un solo cuerpo (el) individual y (el) colectivo. Una segunda presentación, también en la noche, tuvo lugar en la explanada contigua al lugar de la ceremonia del cañonazo de las nueve en la Fortaleza de La Cabaña.

Extracto sobre Tamara Cubas del texto sobre los artistas participantes del Bienal de la Habana.

Margarita Sanchez. Curadora / Cuba

Cuerpos rabiosos: un recorrido crítico por la obra coreográfica de Tamara Cubas

Introducción 

Realizaré un recorrido crítico por las últimas 5 creaciones escénicas de Tamara Cubas. Me propongo ver qué hace en sus coreografías, qué formula en ellas: la política y la ética que sus obras movilizan, o mejor: lo que estas creaciones hacen. Mi intención es observar a través de ellas – como quien mira por una rendija – algunas decisiones, metodologías y motivaciones que dan lugar a las mismas y que caracterizan su proceso de investigación. Examinaré también los procedimientos (o “experimentos”) mediante los cuales desarrolla sus investigaciones artísticas: el modo -por ejemplo- en que la artista emplea al archivo como una práctica y como una herramienta.

Mi gran cometido es develar algunas claves de ese fantasmagórico conjunto que es la obra de Tamara Cubas.

Las obras 

1. ATP (2008): Investigación experimental de cuerpos con sentidos. 

2. Actos de Amor Perdidos (2010): Archivos perdidos y amores en acción. 

3. Plan de Consistencia (2011): Coreografía al revés para cuerpos desorganizados. Una obra de danza filosofía y rockanroll. 

4. Proyecto Multitud (2011): decisiones colectivas en el espacio público. 

5. Subiendo una montaña (2012): Coreografías empáticas y lecturas performativas.


PERRO RABIOSO 

Arte y política.

Tamara es co-directora de Perro Rabioso, colectivo que realiza producciones artísticas, proyectos culturales y diversos tipos de colaboración con artistas nacionales y extranjeros.

Desde el 2002 Perro Rabioso ha generado espacios de creación artística interdisciplinar, integrando música, video, danza y performance. También organiza eventos puntuales y proyecta, hacia adelante, montar una grabadora de discos, ciclos de música acústica, producciones con artistas invitados, talleres, proyectos de circulación de profesionales y grupos de danza. El co-director es Francisco Lapetina, esposo de Tamara, músico y comunicador visual. Los acompañan diversos colaboradores - artistas, gestores, docentes, amigos - siempre en tránsito e inventando nuevas fórmulas de cooperación.

En su página web (perrorabioso.com) el colectivo comunica que a partir del 2008 ha decidido concentrarse en sus propias creaciones, dejando de lado, por el momento, los proyectos culturales.

En esa misma página se encuentran disponibles los registros completos de todas sus obras, e información actualizada de sus creaciones y proyectos, además de bitácoras, diarios de creación, referencias artísticas y teóricas, etc:

Creamos espacios para los contenidos que deseamos trabajar y para las interrogantes que tenemos. Es un grupo con diferentes intereses artísticos (video, música, danza, diseño, etc.), que se dedica al área de creación y gestión o producción. Un grupo que entiende a la obra de arte como algo global y que reconoce en el intercambio la posibilidad de hacer algo más rico. Cuando producimos un concierto de música de una banda que es parte de ese colectivo, pensamos en cada soporte relacionado a la música, como un video promocional, el diseño gráfico, el arte que será parte del lugar, en varios aspectos relacionados, que para 5. Subiendo una montaña (2012): Coreografías empáticas y lecturas performativas. 2 nosotros son tan importantes como la obra. Es una relación de colaboración y una experiencia muy rica para los artistas. Y es también algo político, la política tomada como acción. Las realizaciones se basan en las creaciones de los propios artistas que participan y de producciones que son hechas para terceros. (2004)(1)

La premisa que siempre está presente es el intercambio, la reciprocidad. Cubas se deja interpelar por sus influencias y referencias. “Levanta” mucha motivación estética y política de sus colegas. El copyleft, por ejemplo, es una práctica aplicada a la obra propia y ajena: todos los registros de sus obras escénicas están disponibles para su visualización en la web y para ser usados o consumidos por quien lo desee del modo en que le apetezca. De la misma manera, Cubas se apropia, en sus obras, de estéticas y referencias de otros artistas, integrándolas a sus preguntas y a sus búsquedas expresivas. 

La investigación y las tomas de decisión colectivas -ese estar y hacer juntos y ese poner a disposición todo los materiales y registros del proceso exploratorio- manifiestan esa política artística que mencionaba líneas atrás.

De hecho, en sus obras, la cuestión de “la originalidad” de la creación artística es problematizada y cuestionada.

TAMARA CUBAS 

Preguntar. Desafiar.

Cubas crea desde el lenguaje físico. Los cuerpos son el elemento de su escena. Su obra plantea preguntas desde el cuerpo, con él: el cuerpo pregunta. Sobre el pasado, sobre los límites de la escena, sobre la expresión, sobre el espectador, sobre las relaciones entre danza y teoría, sobre las relaciones entre danza y otros lenguajes...Preguntas que la danza viene haciéndose desde los años 60.

Preguntas que todavía están abiertas.

Su obra coreográfica cuestiona los modos de verdad hegemónicos: los modos de construcción de verdad que la danza tradicionalmente ha movilizado. Desafía, inclusive, las propias condiciones de posibilidad de la misma...

Señales de búsqueda.

A lo largo de sus obras, Cubas ha forjado algunas marcas de autor. En la heterogeneidad de sus obras pueden trazarse algunas continuidades, detectarse algunas señales de búsqueda.

Experimentación es una de las palabras claves para acercarnos a su trabajo. En cada una de sus investigaciones escénicas nos encontramos con múltiples recursos y decisiones: el uso de la caja blanca y de la cuarta pared, la producción y la manipulación -en vivo- del sonido que produce la escena, los proyectos de colaboración con compañías extrajeras, los estudios al aire libre, la creación en el extranjero, las propuestas con intervención del público, las exposiciones museísticas, los videos, la decisión de trabajar con la imagen como principio generador, de pensar global y localmente, de construir discursos apoyados en el lenguaje oral y prescindir de él completamente, de abordar lo personal, lo nacional, lo diatópico, lo utópico, sin entrar siquiera (aún) en las exploraciones y discursos corporales que se presentan en cada una de sus creaciones.

Archivos.

Cubas registra y archiva (en diversos soportes) gran parte de los materiales que surgen de sus exploraciones creativas. En su texto sobre La Patria Personal (proyecto que presentaré más adelante), la artista afirma lo siguiente:

Quizás entonces la herramienta del archivo pueda ser una posible forma de relación con ese pasado plagado de situaciones, actos y pasajes que se opta por dejar fuera pero que el deseo de relacionarse con ellos persiste, reaparece. (...) Se reconoce la brecha constitutiva que media entre la realidad y su representación en el lenguaje o la imagen, por lo que se abre a diferentes posibilidades de representar lo real y sus memorias. Se prevé un archivo como una narración en potencia que posibilite diversas interpretaciones y representaciones propias y de otros artistas. Estas narraciones dependerán de la forma de navegar por el archivo, de los criterios de quienes lo consultan y del azar.(2)

Aunque aquí se refiere a hechos históricos pasados que su archivo registra, analizaré sus obras como actos presentes, como parte de la historia que, aunque escénica, resulta tan real como los hechos que aparecen en los libros de historia o los que materialmente determinan nuestra experiencia cotidiana.

Para construir un archivo con y de 5 obras escénicas, haré una inmersión en cada una de ellas para analizar simultánea e integradamente los siguientes elementos:

1) Las metodologías de creación inventadas para y durante los procesos. 

2) Las colaboraciones artísticas que Cubas ha explorado en los últimos años de creación. 

3) Las experiencias paralelas tanto biográficas como profesionales que han acompañado el desarrollo de su repertorio. 

4) El modo en que lo político está presente en su obra y las estrategias heterogéneas para su abordaje. 

5) La obra como investigación y la investigación como obra. 

6) La mirada desde y hacia la danza que Cubas construye con su obra. 

Las obras

1. ATP (2008)

Investigación experimental de cuerpos con sentidos

“No se me ocurría nada sobre qué hablar. Tampoco visualizaba una estética o posibles formas finales; ni siquiera estaba o estoy preocupada por la forma final”. 

¿Cómo hacer una obra cuando no se tiene claro qué se quiere decir? 

¿Cómo iniciar un proceso creativo sin un tema definido? 

¿Por qué estar en escena?

 Estas preguntas fueron el impulso inicial de ATP. Tras un proceso de investigación que Cubas comienza después de abandonar su cargo como gestora del Ministerio de Educación y cultura, ATP resulta del deseo de ocupar un escenario y no saber cómo o porqué hacerlo. El punto de partida para destrabar la encrucijada creativa fue un método aplicable al cuerpo y al pensamiento: entrenamiento. O mejor dicho: entrenamientos.

Egresada del Instituto de Educación Física, Cubas recurre a las herramientas del entrenamiento deportivo con el propósito de aguzar el cuerpo y la acción. Nada mejor que esta disciplina para la búsqueda de un cuerpo que acciona sin dramatismo ni intención: ver el cuerpo en acción, como una vena latir, como un pelo erizarse, como un cuerpo acelerando la corrida y el pulso.

“Adenosín trifosfato” (del inglés adenosine triphosphate o ATP), es “un enlace de moléculas fundamental para el esfuerzo físico”. Según explica Cubas, “es el combustible necesario para que un cuerpo se mueva”. Potencia, flexibilidad, equilibrio...son algunas de las consignas que organizaron el trabajo de entrenamiento corporal. Y el hecho de “mantenerse alejados de las ideas”, buscando la composición plástica por sobre la hermenéutica.

Sin embargo, estas premisas no implicaron dejar de pensar. El proceso creativo de ATP fue un diálogo constante: conversaciones e intercambios durante todo el proceso abrieron un espacio de discusión acerca la metodología que se emplearía. Múltiples subjetividades fueron convocadas a pensar juntas, no sobre un tema en particular, sino sobre la propia investigación, cuyo objetivo era una creación escénica con foco en el cuerpo.

ATP participó en el Seminario de Metodología de Investigación y Creación en danza, coordinado por Carolina Silveira, Paula Giuria y Claudia Pisani, y financiado por MEC. Éste proponía un espacio abierto entre diversos procesos creativos en danza a través de encuentros, discusiones, ensayos, charlas y, finalmente, un libro escrito por Silveira donde se analizaba cada proceso3.

Esta instancia fue clave para el desarrollo de ATP, ya que proporcionaba un 3 El capítulo dedicado a ATP se titula “Dirás siempre lo mismo” y encuentra disponible en: http://www.perrorabioso.com/node/1915. 6 espacio polisémico y diverso donde las obras eran acompañadas, criticadas y cuestionadas, y donde además se dieron interesantes discusiones sobre la danza, sobre la integración de lo sonoro en las piezas, los abordajes fenomenológicos del cuerpo y las posibles intersecciones de la danza con otros lenguajes y disciplinas. 

El formato de este seminario determinó un input constante, ya que integraba miradas “otras”, “foráneas” (con diferentes grados de experiencia y diferentes visiones sobre la danza) que nutrían el proceso de configuración de la obra.

Sumado a este proceso dialógico, Cubas escribió una conversación ficcional entre algunos filósofos, teóricos y artistas que tomó como referencia para esta obra. El texto “Conversación con ellos”4 describe un encuentro ficcionado con Roland Barthes, Luis Valenzuela, Mauricio Kartun, Francis Bacon, Claudia Pérez (quien a su vez era una de las docentes invitadas por el Seminario) y ella misma. La coreógrafa conversa con sus referentes al tiempo que plantea algunas palabras claves para su investigación: Experimentar, Método, Accidente, Azar –Imagen, Estructura, Representación, interpretación, No clausura, Proceso orgánico, Poner en relación, Conflicto, El discurso en el tiempo, El tema.

Sobre estos ejes, y con sus convidados de honor, Tamara organiza el diálogo. Este mecanismo ficcional de escritura la ayuda a visualizar y a conceptualizar la obra. Se abre así a la experimentación, a la salida hacia afuera de lo conocido.

En uno de los fragmentos en los que se dirige a Barthes, Tamara escribe:

Quizás esto que planteas tiene relación con la forma en como me apropio de ustedes. Fui subrayando pasajes en los textos, pasajes que me parecían interesantes, y que observándolos y analizándolos hoy tienen todo que ver, inclusive están relacionados unos con otros. El proceso de subraye no fue racional, digo no fue en relación a una idea de investigación en la cual estaba inmersa. Pero al transcribirlos, extraerlos del contexto y conjugarlos están totalmente relacionados y me ayudan a comprender el proceso que estoy realizando. Quizás por que se trata de un fantasma la investigación y estos textos o pasajes como rayos de luz que iluminan un objeto pequeño o parte de un objeto en mi mesa de trabajo.

Pero además de esta conversación ficticia, la polifonía de la obra es alentada desde encuentros presenciales con “terceros”, ya que durante la segunda parte del proceso de ATP Cubas invitaba semanalmente a personas externas. Los invitados, sin contextualización y en un encuentro privado con la directora, le hacían una devolución de lo que habían visto.

“Esa estrategia –señala Cubas- me permitió ahondar sobre el significado, ya que fuimos moldeando y limpiando la pieza en función de los que los demás 4 Disponible en: http://www.perrorabioso.com/node/1179 7 leían. ¿Me reconozco o no en lo que ellos ven? ¿Me interesa o no que se lea lo que leen? ¿Me espejo en otro para definirme?” El diálogo con el otro es, entonces, punto de partida, proceso y finalidad de ATP. Veamos ahora cómo se organiza coreográficamente...

Al comienzo de la obra los performers están fuera del escenario, donde también vemos un sonidista y su bandeja. El espacio blanco y la luz intensa subrayan cada detalle del espacio, que permanece inhabitado por algunos segundos. A continuación, Jaime, Marchesano y Turenne entran en la escena. Pegan papeles a las paredes laterales del cuadrado blanco y los consultan cada vez, entre escena y escena, como si esos papeles estuvieran indicando lo que deberán hacer a continuación y lo que deberán vestir (o desvestir).

Estos momentos diferenciados conforman una estructura discontinua que invita al espectador a decidir cómo integrarla (o no). ¿Pero por qué la percepción del espectador se obstina por catalogar estos momentos como un afuera de la escena? Esta interrogante está planteada desde el comienzo, y la obra tejerá su hilo conductor desde esta discontinuidad. 

Si bien la relación entre los 3 es endogámica, hay una relación con un “afuera”: el de las indicaciones escritas y el que manipula en vivo los sonidos de la escena. La neutralidad que sugiere el blanco y la no intencionalidad de las acciones está paradójicamente plagada de imágenes y conexiones.

La neutralidad no es posible y en todo caso lo que vemos como in-intencional en la acción de estos cuerpos está marcado por su propia determinación de serlo. Porque, en todo caso, la neutralidad es un estado, y no una ausencia de estado. ¿Pero por qué la percepción se obstina en elaborar categorías y etiquetas para lo que se le ofrece?...me pregunto mientras re veo la obra.

En ATP la acción no es representativa sino presentativa: se está percibiendo en el momento de su ejecución, y por lo tanto la atención no está en la partitura original de movimientos sino en el instante en que el cuerpo realiza la acción. Happening: está sucediendo.

La amplificación de los detalles es visual – contra fondo blanco – y sonora, mediante el dispositivo de micrófonos y manipulación del sonido de los cuerpos en tiempo real. Los micrófonos son incorporados a la escena como objetos, con sus cables, su peso y su poder de resonancia.

En una escena, dos de los performers desenroscan la tapa de los micrófonos y examinan el cuerpo desnudo del tercero, que yace en el piso inmóvil. Recorren algunos tejidos capilares, la piel y la protuberancia de las venas expuestas debajo de la piel. El contacto de los micrófonos con el cuerpo produce sonidos que sin la amplificación no serían audibles.

Escuchar el pulso de un cuerpo a la distancia es una experiencia a la vez sonora y táctil. Al mismo tiempo, la imagen de dos cuerpos examinando a un tercero que yace inerte dispara múltiples asociaciones, sin ser nada que podamos reconocer con certeza. Ninguna de las asociaciones es, pero tampoco ninguna no es. No hay lectura falsa porque tampoco hay una verdad propuesta de antemano.

Del mismo modo, la amplificación y manipulación del sonido escénico lo torna extraño e identificable a la vez. Los micrófonos amplifican lo que es casi inaudible y al mismo tiempo hacen accesible lo táctil, pero de un modo sonoro: son juegos analógicos o correspondencias entre los diferentes planos que integran la escena.

Otra escena de ATP es “la isla”5: dos performers funcionan como base y el tercero se encuentra en la cima, pisándolos y trepándolos como si fueran rocas o escombros. La vulnerabilidad de los cuerpos que sostienen el peso es enfatizada aún más por su desnudez. Vemos a la piel reaccionando ante al peso, poniéndose roja. Vemos temblar la carne por el esfuerzo.

El cuerpo es llevado a un extremo. Pero no por ello se cosifica. Está presente: percibe, sostiene, pesa. Los cuerpos realizan acciones que los vinculan. Construyen su singularidad a través de esa interdependencia: su enlazarse en acciones con los otros. Esta relación – en constante mutación - se materializa mediante diversos experimentos físicos. Otras veces el vínculo se entabla sólo a través de la mirada. 

En una de las escenas más potentes y simples, los 3 performers corren por el espacio y se detienen simultáneamente. Se miran y miran alrededor. Perciben la transformación del espacio en cada una de sus pausas. Cada elección propone una nueva configuración. El espacio es permanentemente re- configurado en sus coordenadas por estos 3 cuerpos que lo habitan y escriben en él, desplazándose y abriéndose a la escritura que el espacio hace sobre y entre ellos.

Así como las premisas y las pruebas cambian de escena a escena, el cambio de ropa es realizado en cada una de las consultas al papel. No aparecen nuevos vestuarios. Cada uno de los performers realiza una serie de combinaciones con el set inicial de ropas con el que entran a escena por primera vez. Esta decisión hace que cada uno de los cuerpos tenga una singularidad en permanente transición: no se trata de un vestuario que enfatiza una personalidad, un personaje o una personificación, sino que juega con la dialéctica entre aquello que nos identifica como individuos y aquello que nos identifica con ente colectivo. Igual pero diferentes. Diferentes pero en muchos aspectos iguales. La igualdad y la identidad son desestabilizadas por esta secuencia de permutaciones. Y cuando el cuerpo está desnudo aparece nuevamente la ambigüedad: los 3 cuerpos semejantes y radicalmente diferentes en la singularidad de cada piel, forma, pulso, tono muscular, modos de hacer, de mirar, de respirar.

Con el cuerpo como protagonista y constitutivamente perceptivo (más que psicológico), con el cuerpo inherentemente materia-l (y no idea-l), la desnudez no iguala, sino que expone la diferencia irreductible entre los 3 performers.

Luego de dos o tres instancias de escena-papel-escena, comienza a incrementar nuestra ansiedad de espectadores. Lo no conocido dentro de una estructura conocida aumenta la ansiedad y complejiza la relación entre restricciones y posibilidades.

¿Qué nos produce saber qué algo tendrá lugar pero no saber cómo?

ATP tiene una estructura cíclica y anti-climática. Cuando la escena alcanza un grado de tensión o extensión que la acerca a un significante, la misma se termina abruptamente. La acción es interrumpida sin transiciones. Los performers van hacia sus papeles y proceden. No hay inmersión dramática en lo que se realiza, pero sí un estar ahí, completamente presente en cada una de las acciones. Esa presencia no se diluye en el “afuera”. Durante la lectura de sus partituras y el cambio de ropa los performers están presentes. ¿Qué es entonces lo que nos hace percibir esta acción como extra-escénica?

Esta pregunta, que ya dejábamos planteada líneas atrás, la hace la obra misma, y lejos de ofrecer una respuesta, propone un cuestionamiento ante las certezas. Nos seduce pero es un coito interruptus: nos invita a un juego en el que los hábitos de recepción no pueden ceñirse a sus costumbres. Cubas quiere hacer trabajar al espectador. Lo saca del hábito de la representación: presenta, antes que representar. El espectador moviliza su propia percepción: se mueven los sentidos y las certezas.

ATP no propone conceptual o ideológicamente, ya que se basa en imágenes que funcionan como “semillas generadoras”. “Cuanto más hablas menos significas”, dice Godard en uno de sus guiones citados por la artista. Del mismo modo, cuanto menos representa la obra de Cubas más presenta y más deja trabajo para el espectador y para el crítico.

Ahora bien, ¿cuál es el fantasma de la obra?

Hay una cierta impermeabilidad en las sensaciones de los cuerpos que nos presentan una acción sin reacciones emocionales. El placer o el sufrimiento no se hacen visibles sino que hay un entrenamiento volcado a la acción no psicológica. 10 Abandono la sala llena de conflictos y preguntas: ¿qué produce la decisión de des-personificar estos cuerpos? ¿Qué despierta en mi propia sensibilidad la ejecución precisa de estos cuerpos entrenados para la acción sin intencionalidad, sin expresividad?

Me incomoda la pretensión de neutralidad, el discurso de un cuerpo sin marcas ni subjetividad, la universalización de estos performers en un sistema atemporal e ilocalizable. Sin historia, sin futuro. Ejecutando con la frialdad técnica de un mercenario o de un burócrata. Pero intento enfocarme en lo que sí hay y no en lo que me ha faltado, ya que esa falta probablemente provenga de mis hábitos como espectadora, de mis propias expectativas. Me gustaría poder des-hacerlas, desarticularlas, retirarlas del camino. Descubro que el fantasma en la obra es el propio significado, y que el trabajo de metaforización de las imágenes que se acaban de pasar no ha sido anulado por este accionar concreto de los cuerpos, sino que, por el contrario, es la invitación que la obra me ha extiende.

La “ausencia de” (intención, emoción, interpretación) denota una presencia que sólo la relación de cada espectador con la obra puede ocupar.

¿Cómo se baila una imagen? ¿Porqué una obra debería explicar lo que significa? ¿No es suficiente con lo que hace?

2. Actos de Amor Perdidos 

Archivos perdidos y amores en acción

Creada por Cubas en 2010 como parte de su proyecto La Patria Personal, Actos de amor perdidos comienza en mayo del 2009 en una residencia en Río de Janeiro y Teresina, Brasil, propiciada por el proyecto Colaboratorio del Festival Panorama de Río de Janeiro. Según Cubas, varias de las imágenes y escenas surgen de intercambios con otros: los artistas Nicolas Bordier, Sergio Caddah, Equipo Colaboratorio 2009 Río de Janeiro, Núcleo de Creación do Dirceu de Teresina, Mateo Etchegoyen y con Elsa, Mirta, Mireya, Nelys y Luis Cubas.

El inicio de este proceso coincide con el segundo fracaso en urnas uruguayas de la tentativa de anular la  Ley de Caducidad, que dejó impunes los crímenes   de Estado cometidos por la dictadura uruguaya (1973-1985) 6 . El referéndum de 1989 y el plebiscito de 2009 (en los que la mayoría de uruguayos optó por mantener la ley que anula el juicio e investigación de la violación de derechos humanos cometida por funcionarios militares y policiales durante el gobierno de facto) fueron dos derrotas significativas para las organizaciones de familiares de desaparecidos movilizadas por la investigación de estos crímenes. La historia personal y familiar de Cubas -cuyo tío es un desaparecido político- es afectada directamente por esta coyuntura, y no es casual que comenzara a indagar en su álbum familiar.

Sin abandonar la escena pública, La Patria Personal (en adelante LPP) y Actos de Amor Perdidos presentan el resultado en proceso de una práctica de archivo, de la memoria ejercitada desde lo personal, que es inherentemente público y político a la vez.

En el período de la historia reciente del Uruguay, la intersección entre lo político y lo personal es un marco fundamental para comprender una serie de violencias aplicadas desde la institución militar y desde el estado. Los modos de resistencia y de lucha se dieron colectivamente por parte de una izquierda determinada a no desmantelarse, y derivaron en la desaparición, muerte, encarcelamiento y represión de individuos concretos; personas con nombre y apellido. La justicia, entonces, en este caso, pregunta por las caras que están detrás de las instituciones, las vidas detrás de ideologías, la responsabilidad detrás de los actos.

La imposibilidad de asumir ese pasado colectivo desde un presente democrático hace que Tamara invente sus propias estrategias de memoria y de justicia. El pasado no puede dejarse atrás. La relación con él y con los posibles modos de construir un archivo son, por tanto, los focos principales de investigación del proyecto. Tamara dice en su web: 

Quizás entonces la herramienta del archivo pueda ser una posible forma de relación con ese pasado plagado de situaciones, actos y pasajes que se opta por dejar fuera pero que el deseo de relacionarse con ellos persiste, reaparece. Así como reaparecen bajo otras formas los sucesos o las decisiones tomadas en el pasado que no se tratan.

El pasado vuelve como un fantasma o un espectro que impide su anulación; reaparece involuntariamente, abramos o no esa puerta. Los modos de relacionarnos con él son diversos, y en esta multiplicidad Cubas investiga cómo construir “una base de documentos transitable, consultable, abierta a diferentes lecturas, como forma de entender e intervenir ese pasado”.

Este carácter abierto de la obra es una invitación a inventar nuevos y alternativos modos de relación, de navegación. El archivo que LPP construye no está interesado en la veracidad documental, ni tampoco en la transmisión “objetiva” de los hechos7.

 Ahora bien, ¿cómo se traducen estas premisas historiográficas a la obra escénica Actos de Amor Perdidos?

A través de diferentes actos -término que remite a la acción pero también a la estructura propia de la dramaturgia del ballet y el teatro- la pieza organiza una serie de referencias y de eventos personales y a la vez públicos, privados y escénicos. Lo nacional se hace presente mediante la alusión a la historia reciente del Uruguay, pero a la vez es desbordado, apropiado por una memoria que no está interesada en los monumentos sino en los escombros, que se apropia de la palabra patria pero la delimita desde un mundo personal.

Lo personal, lejos de ser intimista, se pronuncia desde el centro de la esfera pública. La memoria colectiva es activada, y baila pisoteando la Historia con mayúscula, la historia oficial. 

El tejido narrativo aquí no es lineal sino heterogéneo. La cronología no obedece los modos legitimados de hacer historia. Lo que sí hay son actos mediante los cuales Cubas propone una historia en minúscula, una historia que no busca sustantivos sino verbos, que se relaciona con el pasado no como documento, sino como práctica: practicar la memoria creativamente, amorosamente, y practicarla en el presente, haciendo que el pasado vibre en el cuerpo.

Los actos perdidos son recuperados para re-crearse o re-significarse desde un presente imposible de concebir sin el espesor real de su pasado.

La historia se resiste a ser clasificada como un documento acabado. Las acciones son afectivas, pero no emocionales. Se propone un juego por fuera de la lógica de amigo-enemigo o víctima-victimario. No se trata del testimonio ni del realismo sino de la subjetivación (interiorización) de hechos y experiencias organizadas desde el presente. No hay moraleja sino cuerpos presentes, accionando y abriendo espacios donde los significados están también abiertos, expuestos, presentes.

No hay nada más invisible que un monumento. No hay nada más acabado que un documento. Pero la historia no es pasada sino que está en permanente construcción. No hay patrimonio histórico porque es imposible poseer el pasado. No hay origen ni original, porque la memoria es siempre una reconstrucción que se actualiza en el presente de quien la practica. No hay autor, porque la cosa ya ha sido profanada. No hay versión sino re-versiones.

Mientras algunas de las escenas son protagonizadas por los “verdaderos” protagonistas de la historia familiar y nacional – el padre, la tía de Tamara y ella misma -, otras presentan versiones libres y referencias a obras propias y ajenas. Se citan, sin solemnidad, obras de la Compañía La Casa, Luciana Achugar, Gilles Jobin, La Ribot, Sergio Caddah, Jerome Bel.

La fusión entre original y copia, entre realidad y ficción se condice con un modo de hacer historia que no es individualista ni original, pero que reconoce una narrativa personal y se hace responsable por su organización. La apropiación que Cubas hace de las obras de otros es similar a la que realiza sobre la historia oficial: la saquea, la perfora con narrativas personales que no explican, pero muestran.

A lo largo de los 12 actos aparecen los bailarines, los técnicos, el himno uruguayo, la internacional socialista, montañas de cuerpos, agujeros de risa, la violencia, la danza folclórica típica del Río de la Plata (“Pericón”), lenguajes clandestinos, el Uruguay ganadero, vacas rumiantes, la muerte, la espera y la desaparición: el silencio, el tiempo y las marcas de su pasaje.

En una patria que se niega a practicar la memoria, que se esfuerza por ocultar los actos de odio e injusticia, Actos de Amor Perdidos insiste en recordar, no para activar la nostalgia sino para construir un presente capaz de convivir con los espectros que lo habitan.

El programa – importante en cualquier obra que se organice en “actos” - enumera los 12 actos con sus respectivos nombres y descripciones. El modo de organizarlos y el lenguaje usado me remite a un lugar a medio camino entre el ballet y un museo: se explicitan -minuciosa y sintéticamente- las referencias empleadas en las escenas. El modo de tratar estas referencias explora diferentes estrategias de “traducción” de memorias y recuerdos. Las referencias también integrarán diferentes fuentes que construyen la subjetividad de Cubas, exponiendo así un universo afectivo personal que, a la vez y por eso mismo, se toca con lo colectivo.

Jugaré en este texto a hacer un archivo personal de esta serie de actos que Cubas y sus colaboradores ponen en escena:

En el Acto 1 titulado “Orientales” la letra del Himno Nacional Uruguayo aparece en un letrero de Leds. Cubas entra a la escena con un esqueleto real de vaca en la mano. La letra del himno se superpone con las múltiples asociaciones que invoca el esqueleto del animal nacional: la vaca. Uruguay ganadero, Uruguay for export. Mientras la letra pasa, Cubas está de pie y usa el esqueleto como máscara. Lentamente comienza a mover las manos. La figura antropomórfica se deforma. Las manos en alto modifican la imagen del cuerpo de Cubas. Las nuevas figuras sugieren sumisión...tal vez muerte, o la vida en el gancho del frigorífico.

La transición entre actos se da rápidamente. Pero no de modo mecánico y similar, como en ATP. Aquí el cambio es asistido por “los técnicos” (Cubas y sus invitados-colaboradores). En una coreografía ensayada con precisión, el grupo espera en los bordes del cuadrado que delimita la escena y trabaja en equipo cuando llega el momento de pasar al siguiente acto. Los técnicos están vestidos de negro e intervienen en la escena. Como en un backstage sin back. Todos saben qué sigue y proceden con una eficiencia y precisión perfectamente concertadas.

Esa relación colaborativa es parte de la obra. Devela el artificio: los espectadores participan de ese “entre”, integrado al material escénico. Este estar por fuera pero ser constitutivamente parte de la obra es un borde esencialmente político: pone en cuestión los diferentes modos de participación en un espacio compartido, y sacude las normas que definen a quién le corresponde qué, y cómo debemos/podemos –como espectadores- leer esos roles que se mueven y mutan.

Mientras miro la obra, pienso que la intervención del ejército en la vida democrática civil es, a veces, pensada como la de un organismo dotado de la técnica de pacificación que el país necesitaba. Los técnicos de la economía neoliberal de ese período justificaban como “técnicas neutrales” ciertas decisiones políticas y/o ideológicas. Podríamos pensar que el capitalismo se construye, de hecho, sobre argumentos técnicos, y que el desarrollo de la tecnología y de la ciencia son parte de una cosmología que se auto-legitima como “basada en la eficacia de su performance” (que otros le llamarán pragmatismo).

Más allá de estas asociaciones y lecturas, la estructura de la obra parece preguntar: ¿son los técnicos “parte” de la obra? ¿Cuán responsables son de lo que sucede en la escena? ¿Cuán co-autores? ¿Cuán serviles a “los protagonistas”? ¿Quiénes son los protagonistas?

La escena de La danza del bastonero del Pericón Nacional (danza folklórica tradicional uruguaya)8 se estructura en torno a la voz de aura (“prepararse para el cambio de compañero. Aura! No hay flor más linda que la mujer, aura! Viva la patria libre que nos dejó José Artigas....”). 

Con una caja que dice “conservar en lugar seco y fresco” Cubas sigue la coreografía. Pero no hay compañeros ni compañeras cerca. Baila sin ver, sin encontrar a sus compañeros. La coreografía los imagina allí, y hace evidente que el pericón no es posible si no es colectivo.

La danza social es aquí performada por una sola persona. Se trata de una adaptación solista de un baile grupal: una figura surrealista -cabeza de caja- danza a la voz de aura. El cuerpo danza pero no ve. Con la visión obstruida por la caja, Tamara percibe el espacio de otro modo y nos pone en contacto con un cuerpo alterado por esta intervención.

En el próximo acto el cartel de Leds se enciende y aparecen números intermitentes: 1, 2, 3, 4... 24, 34... hasta 240: el número de desaparecidos uruguayos registrados. En escena, presenciando el pasar del tiempo y de los números, de pie junto al leds, sosteniendo una pequeña pizarra que dice HERMANO, está Luis Cubas (Padre de Tamara, hermano del familiar desaparecido). Mira hacia adelante. Parece que mira al público, o a un horizonte del que espera algo: una llegada, tal vez un regreso. La escena dura varios minutos. Minutos que pesan, nos tensan, nos impotencian. Y nos potencian al mismo tiempo.

Fin del acto. El control del cartel del leds suena, se apaga y es retirado inmediatamente. Cubas toma la pizarra y, con ayuda de “los técnicos”, clava un palo en modo de T., que ahora pasa a ser una pancarta. Regresa al centro de la escena y escribe en la pizarra un mensaje en varias partes. Escribe, nos muestra, borra, escribe, nos muestra: “sería feliz / si escuchara / la internacional socialista / cantada a coro / a la 1 / a las 2/ 3”. Silencio. Nadie canta.

Los espectadores son directamente interpelados a entonar juntos la canción. Hay una decisión colectiva en juego; la obra expone al público a esa decisión. En un espacio en el que cualquier voz que se alce será escuchada por todos (una especie de Ágora contemporánea), esta consigna lanzada a los espectadores diluye las fronteras público/performers y abre un espacio compartido, donde la performance está teniendo lugar entre todos. 

Si el pampero es el título del Acto 5 y remite al viento frío proveniente de la Antártida y característico de la región del Río de la Plata. La otra referencia inmediata es la de la Marcha mi Bandera.9 Nuevamente un ícono de la identidad uruguaya es citado y representado en un espacio dislocado de “lo típico”, lo patriótico. El pampero es producido por 3 esforzados técnicos que mueven grandes cartones para producir corriente de aire. A quien el Pampero acaricia es al trasero de la vaca que Cubas volvió a ser con la cabeza esquelética sobre la suya.

Cabeza de vaca y en 4 patas, busca refrescarse, y para ello gatea para posicionarse ante el cambio de sus ventiladores. No se sabe si está complacida o resignada, pero en un momento se detiene y se agacha. Se apoya sobre sus patas y alcanza la quietud. Fin del acto. Rápidamente Cubas se para. No hay transiciones porque no hay estados sino acciones. No hay personajes sino cuerpos realizando.

Cubas ya salió de la escena antes de que pudiéramos procesar la imagen. Los técnicos esparcen carteles por el piso. Parecen del mismo material que los usados para abanicar. Fuera del cuadrado blanco, Cubas se cambia a nuestra vista. Ni los materiales ni el cambio se ocultan, está todo a la vista y sin embargo hay expectativa, misterio. ¿Qué es lo que se está montando ahora? ¿Qué vendrá? De qué se trata todo esto? El corte abrupto entre la temática y las acciones impide conexiones lineales, pero va generando -o acumulando- un estado (¿de alerta?) en la platea.

A continuación se versiona un fragmento de la obra Laughing Hole, de La Ribot, del año 2006.10. En esta obra, de 6 horas de duración, 3 mujeres ríen frenéticamente sin parar mientras deambulan – extasiadas, delirando, exhaustas- por un piso de carteles con mensajes para nada humorísticos. Las túnicas son idénticas a las usadas por La Ribot, y fueron utilizadas por Luciana Achugar en varias de sus creaciones. Con la colaboración de Carolina Besuievsky y Florencia Martinelli, las 3 mujeres sólo se detienen cuando acaban de recoger los carteles en la parte trasera del escenario.

En ese mismo instante ocurre el emplazamiento. Suenan sirenas y vuelan volantes. El viento viene nuevamente de la agitación de cartones por los técnicos. El público empieza a ser receptor de los volantes voladores. Son avisos de empresas uruguayas que llaman a los trabajadores a volver a sus tareas durante la huelga general de 1973. Sabemos también que fueron extraídos por Cubas del diario El País, y que el sonido de la sirena alude a la bocina del diario El Día, que sonaba en los grandes acontecimientos.

Acto 8: Sector E No 273. El título es por la localización de la tía de Tamara en el penal: es el sector donde se encontraba y su número de presa. Este acto presenta una versión de la obra “Braindance” de Gilles Jobin (1999)11. En escena: Carolina Besuievsky, Florencia Martinelli, Miguel Jaime, Santiago Turenne y Tamara Cubas.

La re-versión es casi idéntica al original. No hay grandes diferencias. Pero, semejante en apariencia, produce una experiencia radicalmente diferente.

El acto 9 presenta una adaptación del video Sector E No 273. Se titula Siempre hay una voz y en él la mujer vaca, en 4 patas, vuelve a la escena. Esta vez se produce un apagón inicial. Luces estroboscópicas habilitan una visión intermitente. Entre flashes podemos ver cuerpos rodeando a la mujer-vaca, que, siempre en 4 patas, parece buscar una salida de ese círculo que la aprisiona.

El décimo acto es 18 DE JULIO. Tamara se desnuda afuera de la escena en el espacio visible del proscenio lateral. Está en escena, desnuda, mirando al público. Él entra con un lápiz de labio en la boca, que se tensa para mantenerse cerrada. El programa indica:

Versión libre de escena de la obra del coreógrafo Jerome Bel titulada Jerome Bel. Fecha en el cuerpo del hombre: Jura de la Primera Constitución de la República. Fecha en el cuerpo de la mujer: golpe de estado cívico-militar en Uruguay.

A continuación Cubas re-versiona una escena propia, de ATP. Cuenta para ello con sus intérpretes originales, menos Marchesano, a quien ella misma reemplaza. La escena es “la isla”, en la que el trío va rotando de posición pero mantiene una configuración en la cual siempre dos son el soporte del tercero. “El número 3 es conflictivo”. No hay duda de ello en este enredo de cuerpos, pesos, pieles.

Al igual que con la pieza de La Ribot, para quien no conoce la obra, o para un extranjero que no conozca los símbolos patrios aludidos, el “no saber”, el no conocer la referencia o contexto de cada uno de estos signos y actos no constituye -en la ética de la obra- una experiencia incompleta sino singular. Más que perderse de algo, se abren nuevos circuitos de sentidos por donde estas referencias circularán.

Ahora bien, este recurso de introducir escenas tomadas de otras obras me provoca una pregunta: ¿qué es copiar danza? La preservación de las coreografías es una preocupación intrínseca en la danza, dado su carácter efímero. Al re-versionar estas escenas Cubas pregunta: ¿cómo archivar una danza? ¿Qué se pierde en el proceso de archivo? ¿Son esos actos de amor, perdidos en el proceso?

Una problematización de lo entendido por original y copia es puesta en escena: ¿es menos válida esta escena que la original? ¿Cuántos de los espectadores que conocían la obra original por su autor pensaron en los derechos de autor? ¿Será que Tamara los está pagando? ¿Puede una danza poseerse? ¿Puede una danza realmente ser plagiada? Por último (en una serie de cuestionamientos que siguen disparándose) se plantea una pregunta sobre el modo de hacer historia: ¿qué se considera un 18 hecho artístico? ¿Qué es pasible de “archivo” para la historia tradicional? ¿Y para la historiografía tradicional? ¿Y para el materialismo histórico?

El doceavo acto se titula Flacas Molleras. Una luz focal delimita un espacio muy restringido. Entran Tamara y su tía Mirtha Cubas. La pequeñez del espacio es opresiva. Remite a la claustrofobia del calabozo. El dialogo que se dará entre tía y sobrina no emplea palabras, sino un lenguaje cifrado y transmitido con los dedos. Se trata del lenguaje de dedos que practicaban las presas en el penal para comunicarse por debajo de las puertas de las celdas. En un dúo en el que Tamara va aprendiendo de Mirtha, re-escriben con los dedos un extracto de carta enviada en 1976 por Mirtha Cubas desde el Penal de Punta de Rieles a su familia.

Ese ha sido el último acto y tras él se apagan las luces. Es el final. Los actos continúan...

El pasado se hace presente por la relación que entablamos con él. Y este hacerse presente no está exento de una potencia transformadora. Como observa Cubas, al relacionarnos con el pasado lo modificamos: “creo imágenes para que el público se relacione con ellas desde su universo”.

Este es el propósito de compartir álbum y actos: un deseo de elaborar el trauma dejado por la dictatura, pero saliendo del discurso de pérdida y victimización. La experiencia de la víctima es en algún punto desempoderante. Por ello en la práctica de la memoria a través del arte vemos aparecer diferentes estrategias poéticas y éticas para relacionarnos con el pasado y experimentar el presente. Esta experimentación (verbo que mejor describe a mi parecer lo que hace Tamara en su obra: salir del perímetro, habitar los afueras) no puede darse sino es en la coincidencia entre acción y percepción. Por eso la danza y la coreografía constituyen ensayos y experiencias que imaginan y realizan diferentes modos de ser, descubiertos en la acción. Se trata de discursos fenomenológicos. Cubas lo expresa del siguiente modo:

La obra es un trabajo de la memoria en el sentido de cómo te relacionas con la historia, más allá de la dictadura uruguaya. Es un ejercicio poético sobre el derecho a trabajar alrededor de la memoria, es decir, que trabajas sobre hechos, datos comprobables o ficticios; sobre lo visto y lo imaginado, y que forma parte de tu historia personal y social. 

Al igual que el pasado no tiene UN solo tipo de recuerdos, esta serie de actos provienen de fuentes diversas y de un discurso perforado en el que lo nacional y lo foráneo, lo real y lo artístico se combinan y re-combinan. Sin embargo, se integran, convergen en esta pieza discontinua y en la re- imaginación de una historia de las trizas del pasado.

Pero la combinación de este archivo se hace en el presente, y en él no existe UNA identidad personal o colectiva monolítica. La identidad siempre se desplaza. Es intertextual y des-localizada: vivió allá pero se mudó acá y volvió siempre a un lugar desconocido.

Actos de Amor discute una “cuestión nacional”, pero no por ello niega la relación con la danza y la filosofía producidas en otros lugares del mundo. ¿Qué implica este tráfico de referencias? ¿Podemos acusar a esta actitud como colonialista? La obra alude a artistas europeos, pero ¿es por eso menos política o comprometida con el contexto del que habla y en el que se organiza?

Actos de Amor muestra que se puede bailar el pericón y citar a Jerome Bel en una misma obra sin por ello dejar de pensar en términos políticos e históricos, filosófica y éticamente comprometidos.

La patria personal de Cubas es Uruguay pero también Cuba. Es una casa pero también una prisión. Es el lugar de vida y de muertes. Casa grande y con alas, casa con celdas y con espacio para la libertad.

3. Plan de Consistencia (2011) 

Coreografía al revés para cuerpos desorganizados. Una obra de danza filosofía y rocanroll.

Serás un organismo organizado y articulado de lo contrario serás un depravado, serás intérprete e interpretado de lo contrario serás un desviado, serás sujeto de enunciación sobre un sujeto enunciado, de lo contrario serás un vagabundo. (Deleuze y Guattari, CsO12)

Presentadas por los intérpretes en tres momentos de la obra, estas palabras fueron extraídas del texto “Como hacerse un cuerpo sin órganos”, de Deleuze y Guattari, críticos del capitalismo desde una visión anarquista y marxista.

El concepto de “cuerpo sin órganos” – propuesto en un principio por Artaud en su texto Para acabar con el juicio de Dios13- busca reformular la idea del cuerpo en tanto organismo o relación entre partes, para explorar un cuerpo sin forma, sin articulación o sin lógica-articulación, desviándose hacia intensidades esquizoides en las que la productividad (o eficiencia) de los cuerpos deja de ser la norma regularizadora y el parámetro de relacionamiento. Lo judicial es sustituido por lo fenomenológico: plano en el que acción y percepción son indiscernibles.

La idea-paradigma del cuerpo como organización de diferentes partes ya había sido atacada en los ́60, desde la danza contemporánea (Sally Banes Democracy ́s body es un ejemplo de crítica al cuerpo jerárquico y funcional). También la vertiente minimalista de la danza y otros lenguajes artísticos y filosóficos venían cuestionando este paradigma. El cuerpo como conjunto de partes es considerado y criticado como derivación de la sensibilidad europea, informada por el dualismo cartesiano (res extensa en términos de Descartes14).

Plan de Consistencia recurre a los excesos, y a un material corporal que se organiza desde el deseo. Se trata de pensar -con Artaud, Deleuze y Guattari- pero a través de la danza y del cuerpo. Esto es: asumir, creativa y perceptivamente las palabras y las ideas del texto. Generar una suerte de base epistemológica/experiencial para pensar al Cuerpo sin Órganos únicamente desde la práctica15.

De ningún modo es una noción, un concepto; más bien es una práctica, un conjunto de prácticas. El Cuerpo sin Órganos no hay quien lo consiga, no se puede conseguir, nunca se acaba de acceder a él, es un límite. (CsO, 1) 

No se trata entonces de un concepto pasible de ser representado. Su resistencia a la representación deviene de su base epistemológica, que entiende al pensamiento como una práctica. El cuerpo se resiste a ser interpretado o a ser vehículo para la representación. Todo sistema de verdad es restrictivo, y por ello el CsO se mueve en el terreno de la paradoja, de la ausencia de significado, de la ambivalencia, de la de- subjetivación.

El CsO es lo que queda cuando se ha suprimido todo. Y lo que se suprime es precisamente el fantasma, el conjunto de significancias y de subjetivaciones. El psicoanálisis hace justo lo contrario: lo traduce todo en fantasmas, lo convierte todo en fantasmas (CsO 3)

En palabras de André Lepecki, quien reflexiona sobre el cuerpo paradójico que la danza contemporánea pone en escena:

Es la paradoja constitutiva del cuerpo que el bailarín expresa al danzar – pero nunca como la representación de un conflicto interno, y siempre como el mapeo exitoso de los flujos de energía que la danza moviliza desde dentro del plan de consistencia del deseo. 16 

Son estos flujos de energías los que se mueven en Plan de Consistencia. Las diferentes escenas no se relacionan entre sí de modo causal. Se des- narrativizan. Proponen y movilizan intensidades disparadas hacia diferentes direcciones. Sin instalar una lógica. Sin terminar de organizarse. Sin una misión trascendente, pero con una atención y tensión inmanentes.

Un CsO está hecho de tal forma que sólo puede ser ocupado, poblado por intensidades. Sólo las intensidades pasan y circulan. Además, el CsO no es una escena, un lugar, ni tampoco un soporte en el que pasaría algo. Nada tiene que ver con un fantasma, nada hay que interpretar. El CsO hace pasar intensidades, las produce y las distribuye en un spatium a su vez intensivo, inextenso. Ni es espacio ni está en el espacio, es materia que ocupará el espacio en tal o tal grado, en el grado que corresponde a las intensidades producidas. (CsO 4)

En el inicio de la obra sólo vemos una carpa, único cuerpo opaco del que luego saldrán los 4 intérpretes, y enseguida una serie de instrumentos musicales de amplificación, comestibles y otros objetos, en una lógica espacial al borde de lo imposible.

Esta desarticulación de los cuerpos (los de lona y los humanos) se produce mediante un in crescendo que parte de una aparente “normalidad” y avanza hasta un estallido sensorial y hermenéutico.

En esta creación -realizada en colaboración con la compañía mexicana Mákina dT- se identifican algunas marcas “de autor” que la artista ha ido forjando tras una producción continuada. También se percibe la maduración de su búsqueda creativa y la aparición de nuevos elementos: la influencia de sus lecturas filosóficas, insertas en el tejido dramatúrgico de la obra.

Las “marcas de autor” se notan en el sonido, producido en escena, en la presencia de artefactos audio-visuales (que además de su uso práctico configuran un espacio escenográfico), en la vestimenta casual y en la coreografía precisa, aunque no distanciada de estados corporales e improvisaciones.

Estos estados con los que los intérpretes mejicanos se comprometen intensamente, construyen un discurso, pero lo hacen performativamente, no a través de planteos psicológicos, metafóricos o representativos.

A diferencia de obras anteriores como ATP - en la que la sobriedad, la asepsia o la austeridad visual y coreográfica predominaban -, en Plan de consistencia aparece el desborde y el descontrol que caracterizan a este cuerpo de deseo. Cuerpo que no busca satisfacción, represión o explicación, sino mantenerse vivo, incluso aproximándose, para ello, al límite con la muerte.

¿Qué quiere decir desarticular, dejar de ser un organismo? Cómo explicar hasta qué punto es simple, y que lo hacemos a diario. Cuánta prudencia se necesita, el arte de las dosis, y el peligro, la sobredosis. No se puede andar a martillazos, sino con una lima muy fina. Se inventan autodestrucciones que no se confunden con la pulsión de muerte. Deshacer el organismo nunca ha sido matarse, sino abrir el cuerpo a conexiones que suponen todo un agenciamiento, circuitos, conjunciones, niveles y umbrales, pasos y distribuciones de intensidad, territorios y desterritorializaciones medidas a la manera de un agrimensor. En última instancia, deshacer el organismo no es más difícil que deshacer los otros estratos, significancia o subjetivación. La significancia se adhiere tanto al alma como el organismo al cuerpo, tampoco es fácil deshacerse de ella. Y el sujeto, ¿cómo liberarnos de los puntos de subjetivación que nos fijan, que nos clavan a la realidad dominante? (CsO 11-12)

En Plan de Consistencia no hay una realidad dominante sino un estallido de círculos hermenéuticos. Tampoco hay una fórmula que sea correcta o “útil” para relacionarnos con la obra. Y no se trata de haber leído o no filosofía estructuralista sino de la apertura al vínculo inédito que podemos establecer con lo que nos es desconocido.

La invención de una práctica coreográfica no es reducible a un paradigma filosófico. Aunque dialogue con filosofías prácticas, no es clasificable en términos conceptuales. Aunque imagine una tecnología para montar un circuito de excesos, no es interpretable de modo lineal, ya que detona conexiones heterogéneas y caóticas en el cuerpo.

A los fragmentos del texto de Deleuze y Guattari se yuxtaponen escenas surrealistas, conflictos coreográficos, escenificación de situaciones características de un proceso creativo y guiñadas a ciertos recursos y elementos del lenguaje de la danza.

En algunos momentos, los performers se acercan al micrófono y recitan fragmentos textuales de CsO.

La experimentación genera diferentes escenas y relaciones en la búsqueda sinfín de ese cuerpo sin órganos.

Sustituid la anamnesis por el olvido, la interpretación por la experimentación. Encontrad vuestro cuerpo sin órganos, sed capaces de hacerlo, es una cuestión de vida o de muerte, de juventud o de vejez, de tristeza o de alegría. Todo se juega a ese nivel. (CsO 2)

Hacia el final de la pieza, una canción compuesta a partir del texto es presentada mientras una pequeña multitud exaltada se lanza a la escena e interfiere con la performance, impidiendo cantar a los performers. Son agentes de captura, de censura. Asistimos a la performance de “asalto a la escena”. Pero la interferencia no es inequívocamente violenta, sino ambigua. Sucede entre el juego y la agresión, entre armas y cotillón, entre cómplices y enemigos: un intento de conclusión interrumpido por el ingreso repentino de extras, que lo impiden y lo censuran con lúdica agresión. 

En la página de Perro Rabioso, en la parte dedicada a Plan de Consistencia, encontramos una Bitácora con ejercicios y experimentaciones realizadas durante su desarrollo. Hay también observaciones de Tamara que denotan un “ir a tientas”, un no saber qué va guiando ese proceso. Cubas reflexiona sobre el material que va emergiendo en los ensayos y entabla conexiones con el texto de Deleuze y Guattari. Ambos aparecen como materiales maleables, que se van contaminando entre sí. No hay una imposición del texto sobre el material corporal, ni viceversa. No hay una “función” fija de cada uno en la obra, sino que es una desorganizada trama de interconexiones que surgen y que van siendo inventadas en la práctica y sólo desde ella.

Mi idea inicial era la primera semana realizar un trabajo más que nada corporal, sin intentar aún introducir contenidos para la obra. Rápidamente ya surgen aspectos que pueden ser de interés y decido ya orientar el trabajo hacia esa dirección. Cuerpo sin órganos, organismo, cuerpo. El grupo como un todo, un cuerpo o un organismo. Heterogéneos, cada uno con sus objetivos, estrategias y particularidades. Sobre todo en el ejercicio de caminar con las manos tomadas y de ojos cerrados, saltan ricas particularidades en cada uno. Diana siempre se choca contra los árboles o se cae en los pozos. Baccio no se contiene y abre los ojos, trampa, o emite algún comentario. El gato arrastra los pies al caminar por lo cual se lleva enredado ramas, Elías es el más frágil, su cuello en general está quebrado, se le cansan los ojos, por lo cual se los refriega y lleva las manos adelante. En situaciones de caía o cuando se encuentran todos perdidos se produce la risa colectiva como signo, al cabo de un rato el gato chista tratando de llevar el grupo al orden nuevamente. Es interesante como el grupo debe organizarse o cada uno intentar aplicar estrategias para llevar al grupo a donde entiende que está la meta de llegada. Objetivo común17. 

En un momento, el flujo de acciones se detiene y se presenta un diálogo entre los performers. Comienzan a discutir sobre lo que están haciendo. Uno de ellos le indica al otro que está cometiendo un error: “se supone que tú te pares allí, no ahí”, “si te colocas tan a la derecha yo no puedo desplazarme hacia allí”. Confusiones, correcciones y aclaraciones típicas de una situación de ensayo. Este incluir elementos del proceso desarticula el tejido dramatúrgico. El error y la falla se incorporan a la obra: no todos los movimientos son funcionales, no todas las funciones son organizadas. La dislocación y el error también existen.

Desde mi experiencia como espectadora, esta estrategia meta-discursiva fue de los elementos que me resultaron más in-orgánicos, más artificiales y colocados como desde fuera. Tal vez en ese sentido exista un vínculo con ese cuerpo sin órganos que la obra persigue: la escena está allí, y no entendemos bien su función o propósito. Está allí como desorganizada y desorganizando. Rompiendo su lógica de “obra”, e impidiendo así su consolidación como “organismo”. Es un cuerpo sin órganos para una obra sin organización.

Plan de consistencia fue estrenada en la sala Zavala Muniz, en Montevideo y presentada más tarde en México. Es interesante observar su recepción crítica: las reflexiones, los elogios y las duras críticas que recibió. Algunas la tildan de fracaso creativo...tal vez demasiado experimental, tal vez poco virtuosa, quizás excesiva. Pero ¿qué parámetros son empleados para pensar la obra? ¿Cómo leer este Plan de Consistencia en los términos que la obra propone? La crítica y su hábito clasificador obstruyen la relación con la obra, haciendo intermediar preceptos o categorías que se le exigen a la danza o se suponen de ella.

Para aproximarnos a las aporías que esta obra pone en movimiento es propicio abordar la filosofía práctica de Deleuze y Guattari (su recuperación del “cuerpo sin órganos” artaudiano) y la crítica de la visión narcisista de Merleau-Ponty en su abordaje fenomenológico del mundo y del sujeto (un cuerpo y un espacio en el que interior y exterior ya no son discernibles). Sin embargo estos saberes no son imprescindibles. La obra es un nuevo cuerpo que se construye como un Frankenstein, a través de diferentes pedazos, y que anda suelto por la escena.

Plan de consistencia se sitúa por fuera de normatividades y teleologías. La crítica ortodoxa -apegada a los modos reconocidos de danza y esperando siempre que las nuevas producciones sean más bien re-producciones acomodadas a sus expectativas- no ayuda a enfrentar la obra. Los automatismos son desorganizados y los hábitos son invitados a bailar, a agitarse y aceptar que la acción no siempre viene ligada a la comprensión. 25 Se trata de percibir al sujeto que se mueve sin querer explicar su acción. El cuerpo sin órganos baila. Baila una danza al revés, por fuera de automatismos, descartando recetas, alejándose de los sacerdotes y de las certezas: 

dios 

y con dios sus órganos 

porque no hay nada más inútil que un órgano. 

Cuando ustedes le hayan hecho un cuerpo sin órganos lo habrán liberado de todos sus automatismos y lo habrán devuelto a su verdadera libertad. 

Entonces podrán enseñarle a danzar al revés como en el delirio de los bailes populares y ese revés será su verdadero lugar. 

(A.Artaud “Para terminar con el juicio de Dios” p.24)

4. Proyecto Multitud

Proyecto Multitud: decisiones colectivas en el espacio público.

Proyecto Multitud (en adelante PM) es una co-producción mexicano-uruguaya integrada por un elenco de 17 bailarines y 2 músicos. Dirigida por Tamara Cubas y su colectivo Perro Rabioso, aborda algunas preguntas y problemas que atañen al cuerpo como construcción cultural y espacio de luchas políticas, al lenguaje de la danza y a las relaciones entre lo privado y lo público y entre arte y sociedad. En la página Web del proyecto encontramos la siguiente definición:

...es una obra de danza que aborda la problemática de la heterogeneidad en la noción de comunidad. Pieza con una estructura narrativa discontinua, que parte de acciones ancladas en el presente, desprovistas de cargas emotivas premeditadas y de cualquier noción de representación. El espacio desnudo y los motivos sonoros diseñados in situ a partir de la manipulación de microfonía, son los recursos mediante los cuales un grupo de intérpretes habita experiencias y construye imágenes para ir hacia nuevas posibilidades de relación con el espectador, una invitación para ser sujeto activo de una experiencia perceptiva visual y sonora abierta a múltiples lecturas y significaciones. 18 

PM cuestiona el uso instrumental del cuerpo en la modernidad, que sitúa al bailarín al servicio del arte y propone, en vez, “un cuerpo visto desde el arte, un objeto estético sobre el que hay que formular preguntas que nos conduzcan a re-descubrirlo y a colocarlo ante situaciones nuevas sobre la escena”.

Eugenia Barba señala que el proceso creativo “puede ser una expedición antropológica que abandone los territorios obvios, los valores conocidos por mí y por los otros”. Así procede PM: des-hace los métodos y los lenguajes, des- habitúa las relaciones con el otro; des-automiza. Su praxis de extrañamiento disuelve los hábitos, lo institucionalizado.

La metodología creativa empleada propone sustituir el principio de composición por el de organización colectiva: todas las partes involucradas contribuyen en la formación del espectáculo. Así, pactada la obra en conjunto, todos los involucrados participan en la configuración de la misma:

...mediante el diálogo, la comunicación y la escucha ponen en juego sus individualidades para ir decidiendo la dramaturgia de la pieza en el momento en que ésta se presenta. Cada una de las escenas cuenta con principios fijos que posibilitan el arribo a una forma, pero el cómo se arriba a ella y el orden de las mismas, es una decisión que el colectivo asume mientras la pieza se presenta ante el espectador (ídem).

Durante la obra, los bailarines caminan, corren, se arrastran, se dispersan, se fusionan, se abrazan, se tocan, se cargan. Todo está permitido con la finalidad de reconocerse, de sentirse parte de una comunidad. (...) Pero también hay momentos de soledad, de fragmentación, de violencia, de despojo, donde se muestra que es muy fácil para el ser humano seguir a otro, imitar, olvidándose de su individualidad y cediendo su poder a otro (ídem).

El proyecto articula las premisas de la investigación corporal y escénica con textos de Deleuze, Guattari, Barthes, Bourriaud, Rancière, Zulai Macias, Peter Pál Pelbart, Virno y Negri. Así, trabaja a partir de la figura del fantasma19, que en la obra es una masa de cuerpos heterogéneos que se desplaza. También a partir de la metáfora de la semilla20 como imagen generadora, o de la conceptualización del cuerpo según la cual “el cuerpo está en el mundo y el mundo está en el cuerpo”.21 Toma, asimismo, la teoría de las intensidades de Deleuze, que configura un discurso no demostrativo ni expositivo, sino intensivo. Otra idea norteadora es la de una estructura inventada a partir del encuentro con lo discontinuo y lo fragmentario. En la fundamentación del proyecto aparecen también: la delicadeza (Barthes), la representación no como instalación de semejanzas sino de diferencias (Hugo Achugar), la extrañeza, la idea de obra como escritura múltiple, del cuerpo como construcción social y de la danza como práctica cultural, construida sobre un paradigma corporal (que la obra intenta descolocar y desestabilizar).

Todos estos conceptos-guía conforman una red no rígida sino permeable y porosa, que permite la contaminación y se abre a los intercambios que se produzcan durante la exploración escénica y en la Web.

“Encontramos la obra en el tercer mes de creación” relata Cubas.

Tanto la obra como la comunidad creativa involucrada en su producción se desorganizan de modos no calculados, llevando a cabo procesos de decisión que disparan posibilidades inciertas, más allá del control de sus “tomadores”. PM hace de este tipo de procesos el propio material coreográfico, poniendo en escena la toma de decisión colectiva, que no es acordada previamente sino que emerge de un diálogo de escuchas. Aunque el término suene contradictorio, proviene de técnicas de improvisación en las que la escucha, el momentum o composición instantánea son habilidades cruciales para la decisión, que se da de modo simultáneo a la acción, en tiempo real. El qué se hace es decidido en el momento de su ejecución.

En una entrevista, Cubas explica:

...una veintena de personas en el escenario, tomando decisiones, negociando, singularizando en el presente. Hay una estructura planeada, de escenas o secuencias de acción, pero el orden, incluso cuáles se hacen y cuáles no, se decide en el momento en que se presenta la pieza. Cada escena está organizada por parámetros o normas de organización interna entre los intérpretes. Organización en lugar de composición. En escena, cada uno de ellos tiene la premisa de singularizar esa norma, que es en definitiva cómo se relacionan con el poder, en este caso, con mi rol de directora. La complejidad de este planteo es que tienen toda la libertad para tomar sus decisiones, pero como grupo tienen que conseguir hacer las escenas y la obra, sostener la pieza. Una cosa es tomar las decisiones entre tres, otra bien diferente entre veinte22. 

En la danza -como en otros terrenos de actuación y organización política- los acuerdos pre-establecidos se tornan rígidos cuando cristalizan. La no pre- determinación de los mismos abre un flujo de energía que detona, en cada acción, la fuerza de un evento.

Derrida se refiere al evento como aquello que irrumpe incalculablemente: una alteración impredecible, una ruptura que posee fuerza transformadora. Quien ordena u orienta los acontecimientos neutraliza y aprisiona al evento, impide su llegada. Por ello, para que un evento tenga lugar, el mismo debe afectar una pasividad, tocar una vulnerabilidad expuesta.17

PM presenta una estética del cuerpo-cosa, vivo pero pasivo, activo en su pasividad: cuerpos que se dejan agarrar, tocar, pisar. Que se ofrecen como superficie para la exploración de otros. Cuerpos cuyo estar ahí es más un exponerse que accionar. Cuerpos siendo y dejándose hacer.

No es una imposición sino una exposición; una apertura a lo incalculable, a lo que Derrida llama “auto-inmunidad”: un tipo de decisión pasiva sin la cual no puede existir vínculo con el otro.

En su libro The Politics of Friendship (1997) Derrida describe este tipo de decisión pasiva:

... la hospitalidad básica o la receptividad a la afirmación o “sí” que viene del otro – como un medio de descubrir la noción de lo político que no es gobernado por un carácter determinado de todas las decisiones soberanas. Lo que está en juego en este cambio, es nuestra habilidad para dar cuenta de la relación entre la razón y la emergencia de algo que tiene lugar, aunque realmente no tiene lugar para tener lugar.23

La soberanía del bailarín, que busca controlar su cuerpo con técnicas de movimiento fijadas según códigos pre-diseñados, es aquí desplazada por un borramiento de fronteras entre el yo y el otro, con el que se erige una relación de hospitalidad:

...la decisión pasiva, que es condición del evento, es siempre en mí, estructuralmente, otro evento, una decisión leída como la decisión del otro. De otro absoluto en mí, el otro como lo absoluto que decide por mí en mí. (...) El conocimiento es necesario a la hora de asumir responsabilidades, pero el momento decisivo o decisorio de la responsabilidad supone un salto por el cual un acto comienza, cediendo en ese instante a seguir las consecuencias de lo que es... y por lo tanto se libera (a esto se llama libertad). En resumen, una decisión es inconsciente-insana como podría aparentar. Ella involucra lo inconsciente y, a pesar de ello, sigue siendo responsable. Y nosotros por la presente, desnudando el concepto clásico de decisión. Es en este acto del acto que estamos intentando pensar: “pasiva”, entregada al otro, suspendida sobre el latido del corazón del otro...recibiendo mí propia vida del latido del otro. No sólo decimos corazón, sino latido del corazón: que de un instante a otro, este corazón recibe.24

Si Kierkegaard nos dice que el instante de la decisión es locura25, Derrida26, por su parte, agrega que las tensiones que se producen entre la lógica filosófica y la ausencia de lógica en la locura son extrapolables a las que se dan entre pensamiento y danza, danza y filosofía:

Para presentar el rostro del otro sin metáfora, el habla no sólo debe traducir el pensamiento. El pensamiento por supuesto, ya debe ser habla, pero sobre todas las cosas, el cuerpo debe permanecer siendo también un lenguaje. El conocimiento racional no debe ser la primer palabra de las palabras. Si uno le cree a Levinas, Husserl y Heidegger, en el fondo, asume la subordinación del lenguaje al pensamiento, y del cuerpo al lenguaje. Por el contrario, Merleau Ponty, “mejor que otros” habría mostrado que “el pensamiento desencarnado, el pensamiento como discurso antes del habla, el pensamiento como constitutivo del mundo del habla, es un mito (...) El pensamiento no puede ser el primero de los lenguajes a menos que se acepte que el pensamiento es primero y de modo irreductible la relación con el otro, pero una relación con un otro irreductible quien se funde conmigo sin la posibilidad de retornar desde fuera ya que éste orden se presenta lo infinito que ningún pensamiento puede encerrar y que impide cualquier monólogo.27

La imaginación, la percepción y la escucha son imprescindibles para una filosofía de los sentidos que se emancipa de la división cartesiana y busca abrir alternativas diversas para pensar y estar en el mundo:

Lo que es llamado sujeto del habla ya no es la persona en sí misma, o la persona sola, que habla. El sujeto de habla descubre su irreductible secundidad. Su origen que es siempre eludido sobre las bases de un campo organizado de habla en el que el sujeto de habla en vano busca un lugar que siempre falta (...) la estructura del robo está siempre presente en sí misma con la relación del habla con el lenguaje. El habla es robada desde que es robada del lenguaje, y es por tanto robada de sí misma, es decir, del ladrón que ha siempre perdido el lenguaje como propiedad y como iniciativa. Porque su previsión no puede ser realizada, el acto de leer perfora el acto de hablar o escribir. Y a través de esta perforación, es como escapo de mi mismo. 28

La escritura o danza se torna así un evento relacional, no controlado por la voluntad o el control semiótico del signo que el cuerpo traza.

El protagonismo del sujeto es reemplazado por su segundidad: un estar ahí fenomenológico y no ontológico, al borde del anonimato. El cuerpo se despoja de psicología y se entrega a una grafía que es en sí misma inscripción, trazo, y no significación.

La racionalidad que opera en el momento de la acción-decisión no es instrumental ni calculadora sino que parte de una escucha, presentimiento o acción pasiva. De este modo, varias de las escenas de Multitud no presentan a seres actuando de modo instrumental o calculado. La acción no tiene un propósito definido y sólo se hace inteligible relacional y situacionalmente.

Un ejemplo de ello es la escena del comienzo: el numeroso grupo entra a escena. Se paran y miran a la platea. Por un momento la imagen se congela. (Recuerdo la obra de Jerome Bel The Show Must Go On: el vestuario empleado, la actitud cotidiana, el tamaño del grupo...). De repente vemos que uno de los cuerpos cae al piso. Como en un desmayo repentino y breve, cae y se levanta. Lo mismo sucede con los otros. Siempre de modo imprevisible y repentino, se va componiendo un ritmo de caídas. La acción involucra, ante todo, un dejar hacer a la gravedad.

Cuando nos estamos acostumbrando a la cadencia de esta acción grupal, la dinámica coreográfica cambia: los performers empiezan a abandonar sus posiciones estáticas y recorren el escenario. Hay cuerpos que caen hacia atrás. Unos llegan a salvarlos, otros caen sin que nadie los ataje. Al no saber quién ni cuándo caerá, la percepción y el cuerpo, alertas, están en actitud receptiva, y siempre listos para responder. Como en un campo de batalla: no se sabe de dónde viene el ataque, pero hay que estar listo para reaccionar.

Esta primera escena adelanta el principio de inter-dependencia y respuestabilidad (mezcla de responsabilidad y respuesta) que actuará durante la performance. Las decisiones están siendo tomadas espontáneamente. Hay entrenamiento y premisas, pero volcadas a los modos de respuesta y relación que se organizarán sin orden pre-establecido, colectivamente: el moverse se dispara cuando la decisión de otro así lo requiere.

Otra escena nos muestra una versión de una coreografía de Cubas que también aparece en ATP y en Actos de Amor Perdidos. En ella unos cuerpos en el piso funcionan como plataforma para el desplazamiento de otros, que los recorren o reptan. La traducción de esta imagen protagonizada por 3 cuerpos en ATP y Actos de Amor Perdidos, se hace en multitudinaria en PM: una línea diagonal en la que muchos cuerpos se alternan en el rol de base y caminantes - reptantes.

Nuevamente Cubas imbrica referencias entre sus obras, tejiendo una densa trama intertextual que incluye obras propias, ajenas, dancísticas y de otros lenguajes.

La montaña móvil de cuerpos es una escena que reaparece en Actos de Amor Perdidos y que se repite en otras obras de danza contemporánea estrenadas recientemente29. Una masa de cuerpos apretados y amasados entregando todo su peso a la multitud, que gravita y que colabora para movilizarse sin disgregarse. La acción coreográfica es ambigua: interrumpe nuestras posibilidades de identificación. No podemos conectar lo que vemos con un concepto o categoría que nos sea familiar. Esta dislocación altera nuestra sensibilidad. Nuestra organización perceptiva se desestabiliza. 

En otra escena, La manipulación, el cuerpo hace pero también se deja hacer, mover, colgar. Los encargados de manipularlo se relacionan con él con curiosidad, sin afecto pero tampoco agresivamente. Esta imagen es recurrente en las obras de Cubas, en las que la acción coreográfica consiste en agarrar al otro, levantarlo, arrastrarlo, pesarlo, doblarlo, medirlo.

El cuerpo agotado, el cuerpo cercano al fracaso, el cuerpo que intenta y que desorganiza su tentativa, la torpeza, el cansancio, el impedimento ponen en escena a un cuerpo radicalmente diferente al buscado por otros tipos de danza. El dominio de la técnica y el virtuosismo es reemplazado por búsquedas infructuosas, acciones inoperantes e im-productivas, movimientos sin causa ni consecuencia. No se trata de una representación psicológica del fracaso sino de la materialidad de su ocurrencia.

En Proyecto Multitud hay lugar para el fracaso porque la estructura de la obra es indeterminada: está abierta y debe ser organizada por el colectivo de bailarines mediante una decisión grupal que tendrá lugar en el mismo momento de presentación de la obra, y no antes. En palabras de Cubas:

El concepto de fracaso como posibilidad fue una noción aportada por alguien que siguió el proceso a través de un grupo abierto en el Facebook. En lo personal fue clave, pues me ayudó a decidir el formato de la obra, aceptando a soltar a que los interpretes decidan sobre la obra e incluso fracasen uno de los días... pues sería un dato de la multitud que no logró organizarse y llegar a su objetivo30. 

La realidad, explica Tamara Cubas, es que “ni capitalismo ni socialismo llevaron a esta sociedad a nada. La puesta en escena se instala en tiempo presente para resolver el presente. (...) No plantea soluciones o un camino a seguir para resolver los problemas actuales. Ni siquiera se fija en lo que algunos líderes internacionales creían que se debía hacer para que el planeta funcionara. Todos estos debates están superados. Nosotros sólo habitamos el espacio y el escenario”. 31

5. Subiendo una montaña (2012) 

Coreografías empáticas y lecturas performativas

La coreógrafa se levanta, y de espaldas hacia el palco vacío – salvo un entramado de cables negros, se dirige a la platea: “Necesito cinco voluntarios, sin los cuales aquí nada sucederá”. Mira al público. Espera. En la medida en que se van presentando algunos, la autora de Solo los conduce al palco, toma uno de los auriculares amontonados en el piso, desenredando los cables, y lo acomoda sobre la cabeza del voluntario. Los auriculares están conectados a un reproductor de sonido digital, que la autora prende en alguna parte de la cintura del participante. Le pasa las primeras instrucciones, relativas al funcionamiento del aparato: aquí se prende, aquí está el volumen, cuidado con el cable al moverte. Sin más, el resto es escuchar.32 

Subiendo una montaña abre una cadena de semiosis múltiple: de Cubas a los performers espontáneos vía audio, del audio a la lectura activa de los performers, de la lectura a la acción de los performers, de la acción de los performers a la lectura del público.

La obra fue presentada por primera vez en un ciclo llamado Solos al mediodía. Pero no hay sólo un cuerpo en escena sino 5. Y no hay obra en un momento anterior al evento. El dispositivo de Subiendo... cuestiona el concepto de “solo”: ¿cómo puede ser un solo una obra donde me relaciono inevitablemente con otros? También complica la identificación de un autor: ¿quién es el autor de Subiendo...? ¿Cubas? ¿Sus performers? ¿Y cuál es la obra? ¿Los 5 audios grabados por Tamara? ¿Las acciones que realicen los 5 colaboradores? ¿Y quien realiza la fruición de la obra? ¿Quién es la audiencia? ¿El público? ¿El otro? ¿Los 5 que escuchan el audio? ¿El resto del público? ¿La propia Cubas? ¿Es esta una coreografía para el disfrute de la propia coreógrafa?

Los 5 voluntarios se colocan el audio y habitan la escena. Comienza la dinámica en tiempo real. No hay certezas: los espectadores no saben qué están escuchando los 5 colaboradores, ellos no saben lo que están componiendo escénicamente, Cubas no sabe qué harán sus colaboradores en la escena...este no saber es común a todos.

Pero ¿qué hay en estos reproductores digitales misteriosos que tienen a los voluntarios absortos y ocupados durante una hora? 

Cubas contó para su composición con la colaboración del director teatral y dramaturgo Gabriel Calderón, quien aportó en la organización dramatúrgica de la acción para los audios. “Yo me dedicaba a escribir desaforadamente cosas que me salían o me interesaban –explica Cubas- y él organizó una primera estructura de los 5 audios que luego yo fui completando”.

Al escuchar esos audios(33) encontramos la voz de Cubas. No se trata de una serie anónima de instrucciones sino de una voz que acompaña a su receptor, que lo alienta, que le hace pedidos, que se ríe descontroladamente, le cuenta experiencias personales y modos de pensar, le habla de esta obra y de aspectos de la creación artística en primera persona. Es clara la intención de esta voz de estar con quien escucha, de agradecer la colaboración y apoyar al colaborador en su exposición frente al resto. Al mismo tiempo hay una alusión explícita a la situación: “mírame, estoy entre el público”, “decime la opción que elegiste, yo estoy aquí y puedo escucharte”, “mira a los otros con auriculares, ¿qué están haciendo?”, “contale al público lo que te estoy diciendo”.

En otros momentos el audio es una coreografía compuesta y bailada en el lenguaje: Cubas describe con precisión movimientos del cuerpo que indica al escucha, y con el ritmo de sus indicaciones se imprime un ritmo en el cuerpo del performer.

La voz no busca objetividad sino que desdobla la presencia de Cubas: está con cada uno en el audio y al mismo tiempo los está mirando. Es un emisor que ya emitió su mensaje y que al mismo tiempo es testimonio de su recepción. Esa asimetría entre instrucciones, acción e imagen escénica en tiempo real determina el carácter eventual de la obra. 

En la voz de Cubas hay indicaciones pero también emociones, reflexiones, complicidad. Y hay un pedido, una interpelación: “si abandonas, nuestra relación no se habrá completado”. Hay un juego planteado y una propuesta procesual para que el mismo ocurra. Pero ello es sólo el inicio porque lo que suceda está en manos – o mejor dicho en cuerpos – de los performers espontáneos.

El de los audios es un monólogo planteado relacionalmente, y tan heterogéneo en su contenido como para impedir al escucha estabilizar una misma reacción ante los diversos estímulos: cambiando abruptamente de tema y de estrategia discursiva, Cubas exige de quien escucha un permanente reajuste de la atención y un constante estado de alerta.

Por otra parte las decisiones que tome el performer-voluntario están siendo afectadas por la presencia de la propia coreógrafa en la sala. Su presencia física se superpone a su voz, que en primera persona alterna pedidos, declaraciones, deseos, opiniones y experiencias personales.

No puedo dejar de preguntarme: ¿qué sucedería si Cubas abandonara la sala luego de distribuir los auriculares? Pero no lo hace. Permanece en la sala.

¿Qué es entonces lo que Cubas dice en este solo para 5 performers y un público desconcertado? Si más atrás Cubas expresaba que deseaba hacer trabajar al espectador, en esta obra esa premisa es llevada al extremo.

Los audios son casi idénticos pero hay entre ellos pequeñas diferencias que complejizan y des-sintonizan a los escuchas: la introducción de una canción en uno de ellos, una risa más prolongada e histérica en el otro, la permutación sutil de palabras (“joder! dije cuando...”, “mierda! dije cuando...”). Esto hace que cada experiencia de las 5 que vemos en escena sea singular pero a la vez tenga mucho en común. Ese casi igual pero diferente se parece a la situación que vemos en escena: la premisa y el estímulo es casi igual para los 5 pero la singularidad de sus reacciones ante la recepción hace que todos actúen de modo diferente. El inicio y el final son iguales en el audio, pero es probable que tampoco sean iguales las traducciones que los escuchas hacen de ellos.

Cuando los audios comienzan, la voz de Tamara cuenta que fue a ver una obra de danza y se aburrió, y entonces se fue en el intervalo, fingiendo ir al baño. Luego le contaron que la segunda parte había sido la mejor. Cubas va ganando la complicidad de su escucha, quien al oír esta anécdota también está en una obra y se encuentra además en una situación extraordinaria en la que ha dejado de ser espectador para gozar (o padecer) de un protagonismo inesperado.

“Mirá, hagamos esto: hagamos una coreografía”. “Ahora te voy a cantar y vos tenés que hacer coincidir los movimientos con lo que yo te voy contando, ¿te parece?” La voz de Cubas no deja solos a sus performers. Plantea una situación compartida: estamos en algo juntos, podemos hacer lo que queremos.

“Me encanta mirar a la gente que no intenta nada”. El estar presente, abrir para que el otro entre. Es esto lo que Cubas pide como regalo de cumpleaños: “Hoy cumplo 40 años. Voy a hacer una fiesta”. Efectivamente, el día de presentación en Solos al mediodía Tamara cumplía 40 años, y le pide a su escucha un regalo: “...dejame estar contigo, dejame entrar. Simplemente estar”.

Cubas va guiando al intérprete para que se abra cada vez más, dejando entrar y dejándose estar. 

“Hermoso, muchas gracias”. Concluye esta escena- regalo. Pero siguen las indicaciones y los pedidos.

“Empezás a caminar en el espacio. Mirás a tus compañeros. Lo que ellos escuchan es parte del secreto y lo que hacen es visible, pero el subtexto es inaudible e inaccesible para el resto del público. Hay algo de misterio, de acto de magia, de secreto no develado presente en la performance. Esto abre la percepción del público ante la acción. Pero imaginemos que estamos frente a un performer que ejecuta una partitura 37 de movimientos coreografiados antes o incluso durante la presentación: ¿no sería la acción también opaca en algún punto? La ilusión de transparencia del cuerpo en escena es una herencia de los paradigmas más tradicionales de la danza, que conceptualizan un cuerpo cartesiano, claro y distinto, que en su apertura exhibe su supuesta “verdad”. 

“Elegí a tu preferido. Yo siempre tengo un preferido en escena. No te olvides del preferido. De eso se trata la vida”. “Mirá al público, deciles que los amas. Busca un defecto que les sacarías. Ahora odialos. Ahora ellos te odian porque sos falso, cursi, un cliché. Ellos se mueren de ganas de saber lo que te estoy diciendo... pero no ha habido ninguna frase ni pensamiento revelador...”. “Ahora un grito. Vamos a dejar que salga un grito”. “Ves a alguien en el piso? Acostate arriba por favor. Relajá el peso, pesas menos cuando te relajas sobre alguien”. “Sos responsable... se nos va... hace algo antes de que todo se vaya a la mierda!!!”. “Parate frente al público. Los públicos, ahora hay que llamarlos en plural...”. “Hoy podemos hacer esto porque es gratis, nadie podrá reclamar su entrada”. “Son unos imbéciles. Mentira, eso no es cierto. No creo que lo sean. Esa fue una línea que puso mi editor. Quizás algunos, algunos varios...”. “si, como si fueras a tirar un penal”. “Colocate a 5cm de una parte del cuerpo de tu preferido”. Llega el final... “Hagamos algo todos juntos”.

No se trata de una obra ya compuesta al momento de su presentación sino de un happening nacido de la interacción entre una acción y sus reacciones; entre una propuesta y las lecturas activas que el público construye. 

Subiendo una montaña constituye la formulación espontánea de un "texto" coreográfico organizado a partir de otro texto transmitido oralmente. La cadena semiótica a la que aludía en principio involucra entonces a la lectura “original” de la artista registrada en el audio, a la “lectura” de las indicaciones del audio por parte de los escuchas y a la “lectura” de las acciones de los 5 performers por parte de la audiencia. Los tipos de lecturas que se suceden en la obra son diferentes, aunque converjan en un mismo hecho escénico. La obra pone en evidencia las diferentes estrategias de “interpretación” y relacionamiento posible con una misma obra. Y al mismo tiempo pone entre signos de interrogación a la obra en sí, que es des-ontologizada, descompuesta para ser recompuesta en un proceso que deja al autor con poco control sobre el producto final.

El evento, dice Derrida, tiene un carácter impredecible y Subiendo... parece más interesado en provocar un evento que una obra cerrada. La idea de obra abierta34 se aplica a esta creación o experimento, ya que la proposición inicial de la artista es luego puesta en circulación para ser concluida, interpretada y movilizada por otros.

Cubas experimenta una vez más con esa compleja articulación o convergencia entre decisiones individuales y acción colectiva.

En su libro Choreographing emphaty, Susan Leigh Foster analiza los conceptos de kinestesia, empatía y coreografía para luego investigar cómo diferentes creaciones de danza contemporánea experimentan modos alternativos de construir empatía. Esta relación que pone en comunicación a espectador – obra – performer – autor, siempre se desarrolla a través de diferentes combinaciones y es en la exploración de las mismas que muchas obras de danza investigan y montan sus dispositivos coreográficos.

En su presentación de las obras Call Cutta y Cell35, en las que también los espectadores son guiados por una voz a través de teléfonos celulares, Foster observa cómo el espectador es removido de su lugar de receptor (o “cliente” para ponerlo en términos de una relación comercial) y es provocado a actuar, a ser agente coreográfico. Esta acción no implica una ejecución de una partitura ya establecida sino una activación creativa, una práctica coreográfica espontánea que emergerá situacionalmente y que, aunque queda librada a una decisión individual, afectará al colectivo y a “la obra”, que será afectada por ellos.

¿Cuánto piensan los 5 performers de Subiendo en las expectativas del público del que hasta hace instantes formaban parte? ¿La presencia del mismo ejerce presión? ¿O constituye más bien una compañía? ¿El rol activo que implica haberse ofrecido para esta acción disuelve el rol de “clientes” o de espectadores para estos 5 voluntarios? El espectador es descolocado por el carácter inesperado de lo que sucede. Al des-habituarlo de su papel habitual, Subiendo está justamente invitándonos a repensar la relación entre obra-fruidor como una que no tiene que ajustarse necesariamente a las pautas del producto – consumidor, sino que puede proponer vínculos y conexiones alternativas, repensando también esta cuestión en el campo más amplio de la esfera pública, el mercado cultural y el mercado de bienes en general.

Al mismo tiempo, esta agencia propuesta al espectador tiene espacio para la desobediencia, para contrariar un pedido o una indicación, para defraudar la expectativa, para relacionarse con la consigna de modo literal o de modo creativo, desviando la premisa, re-convirtiendo el juego y re-armándolo a partir de la lectura de la misma.

En Subiendo... el que escucha está oyendo la coreografía, pero a su vez es coreógrafo: compone instantáneamente frente a una serie de estímulos diversos y en permanente variación. André Lepecki propone pensar la coreografía como aparato de captura36:

Concebir la coreografía como un aparato es verla como un mecanismo que simultáneamente distribuye y organiza la relación de la danza con la percepción y con la significación. Ya que precisamente este tipo de organización del campo lingüístico- perceptivo que el aparato performa (...) el concepto de aparato es uno que pone en primer plano la percepción como algo siempre ligado a modos de poder que distribuyen y asignan visibilidad o invisibilidad a las cosas, significancia o insignificancia”. (2006:339)

Analizar la coreografía como un aparato que captura la danza (y ubica sus significaciones, movimientos y gestos en campos lingüísticos codificados) es reducirla a sus modos hegemónicos.

El carácter efímero de la coreografía de Subiendo... determina la imposibilidad de capturar la danza en un forma fija y perdurable: es la reacción espontánea, momentánea, no ensayada y no perdurable la que aquí es puesta en escena. La danza no es capturada de antemano sino que es liberada a la organización que la misma alcanza en el momento de su presentación.

Después de la performance-estreno, contamos con fragmentos que nos pueden ayudar a reconstruirla, pero no ha quedado un video ni una descripción de lo que sucedió. Sólo fotos y audios.

En una artista que practica la política de registrar y disponibilizar todas sus obras en su web, esta decisión de no registrar lo acontecido es significativa y nos dice mucho del propósito de la obra.

ley por un lado y legisla por otro, Subiendo una montaña es más bien una máquina de guerra nómade. Mientras el aparato de captura busca instaurar siempre un centro del poder, la máquina de guerra siempre lucha para que el poder nunca se centralice o lo haga lo menos posible, poniendo a circular Palabras finales Luego de este extenso recorrido no queda duda de que la obra de Cubas se parece a un rizoma: las conexiones y trayectorias no son lineales sino múltiples, las puertas de entrada son complejas y agujereadas, las de salida desconocidas e impredecibles. No me interesa cerrar con conclusiones porque sería como querer domesticar las posibilidades fenomenológicas, semióticas, políticas y estéticas que la obra despliega. Acercarme a estas creaciones me deja sin embargo, algunas observaciones como cosecha: bloques de poder. En palabras de López, el aparato de captura “ quiere zombies mutilados y modelados subjetivamente; la máquina de guerra, por su parte, pretende guerreros que pueden quedar mutilados por efecto de la lucha, pero no del sometimiento”.

Palabras finales

Luego de este extenso recorrido no queda duda de que la obra de Cubas se parece a un rizoma: las conexiones y trayectorias no son lineales sino múltiples, las puertas de entrada son complejas y agujereadas, las de salida desconocidas e impredecibles.

No me interesa cerrar con conclusiones porque sería como querer domesticar las posibilidades fenomenológicas, semióticas, políticas y estéticas que la obra despliega.

Acercarme a estas creaciones me deja sin embargo, algunas observaciones como cosecha:

La tozudez metodológica de una coreógrafa que transita por diferentes estrategias y herramientas, pero que mantiene una actitud investigativa, exploratoria, abierta ante todos sus proyectos.

El equilibrio entre dirección individual y trabajo colectivo: Perro Rabioso no es un colectivo transversal y sin embargo se apoya en el trabajo colectivo. Los modos de reorganización constante de los colaboradores que participan en los procesos guiados por Cubas, derivan en modos siempre cambiantes de configuración de lo grupal, pero manteniendo una dirección clara (tanto en el sentido de orientación como de figura directriz). Ese balance complejo que vemos en términos de colectividad, también lo observo en la polifonía, que es una de las principales características de la voz autoral de Cubas. Este “hacer obra” y construir un discurso desde los otros señala una opción estética, política y filosófica que se desmarca del mito del creador iluminado, del genio compositor aislado del mundo, de la voz de un sujeto que existe antes del encuentro con otro.

En las obras presentadas aquí queda claro que la uruguaya está interesada en desarrollar su obra situacionalmente, pero no por ello niega las dimensiones interculturales y transnacionales que atraviesan al cuerpo y la danza en la contemporaneidad.

El encuentro con el otro cultural, político, colonizador, compatriota, etc. es un disparador que Cubas constantemente aprieta. Y dado que este encuentro no puede ser previsto o planificado – sino dejaría de ser un encuentro y un evento – las consecuencias son impredecibles y frecuentemente híbridas, rebeldes a las categorías.

En el encuentro se organiza un lenguaje que no se orilla en uno u otro continente o identidad, sino que se configura en el entre: ya no sirven la brújula de lo original y de lo repetido, del origen y del fin, de lo que es arte y de lo que es vida.

El entre permite cartografías temporarias pero no mapamundis atemporales, admite cuerpos en acción pero no ontologías ni metafísicas; admite relaciones pero no identificaciones. No hay certidumbres, la lectura se vuelve un laberinto más que una decodificación: no sé en qué consiste mi rol como espectadora, ni dónde comienza y termina la obra.

La experiencia sustituye al saber, o mejor aún, la experiencia es explorada en sus diversas formas, ya que constituye el único modo posible de conocer. De conocernos y de desconocernos.

Lucia Naser / Mayo 2013

SOBRE TAMARA CUBAS

 Cubas nació en 1972 y realizó una licenciatura en Artes Plásticas y Visuales, en el Instituto Escuela Nacional de Bellas Artes, Universidad de la República (IENBA/UDELAR). Más tarde hizo un Master en Arte y Tecnología en EMMA, Escuela de Artes de Utrech, Holanda, premio EMMA Award in Image & Technology. Se formó en danza contemporánea en Montevideo, en la Escuela Contradanza dirigida por Florencia Varela y durante su carrera como bailarina y coreógrafa bailó con el coreógrafo brasilero Marcelo Evelin y Luciana Achugar. Hizo audiovisuales para Contradanza (Uruguay), Demolition Inc y The Meekers (Holanda,) entre otros. En cuanto a su obra coreográfica y videística, su trabajo fue exhibido en diversos países de América Latina, Europa y Estados Unidos. Su experiencia como docente comprende una gama de diversos talleres impartidos en Argentina, Brasil, Chile, Paraguay, México, Uruguay y España y también fue docente de sensibilidad corporal en Facultades de Bellas Artes y Arquitectura en Uruguay. También trabajó en la preparación corporal de actores para obras de teatro (Arturo UI de la Comedia Nacional del Uruguay y Don Juan de Marianela Morena). Fue jurado en festivales y proyectos como Rumos Itaú San Paulo (2006,2009) y Festival de Videodanza ARCIS, Chile. Tamara Cubas ha tenido una producción continuada que la sitúa en un lugar excepcional en relación a la mayoría de directores de danza en Uruguay. Del 2000 hasta la fecha ha producido: Ella no tiene nada que ver en esto, No matarás a menos que, Sin tus ojos, Yo soy otro, ATP, Lloré tan bonito, Actos de amor perdidos, Plan de consistencia, Proyecto Multitud, Subiendo una Montaña, por aludir meramente a sus obras escénicas. En cuanto a obras no escénicas, Cubas presentó recientemente la exposición El día más hermoso (Montevideo 2012) en el Museo Blanes. Ésta última integra el proyecto La Patria Personal, investigación y archivo multimedia que Tamara viene desarrollando a partir del año 2009. Cubas también ha realizado numerosas co producciones y gestionado la residencia de artistas internacionales en Uruguay. Fue directora del Festival Internacional de Artes Escénicas Setiembre Escénico 2009, Creadora del Festival Internacional de Videodanza del Uruguay, creadora y promotora de la Videoteca Montevideo hoy localizada en el CIDDAE. Diseñó y fue la coordinadora general entre el 2006 y 2009 de PLATAFORMA, Programa de incentivo a la producción y la innovación artística (Ministerio de Educación y Cultura, Uruguay). Asesoró en material de danza a proyectos de la Dirección de Cultura del Uruguay como Fondos Concursables, AEscena!. Fue asesora de programación en danza del Teatro Solís entre 2008 y 2009. Jurado de los Fondos Concursables Uruguay 2010. Fue también la única artista de la danza presente en la primera Bienal de Montevideo y representante del sector de la danza en el Mercado de Arte del Uruguay (MAU 2013) en el que expuso un panorama sobre la producción de danza en uruguay y su circulación por el exterior.